(continuação da Parte I)
(Parte I Aqui )
Parte II
Capítulo IV
A
partir do nascimento
Depende
de vós, mães, que aos seis meses o vosso que- ridinho saiba ler: o livro em que
êle aprenderá a discernir o que é preciso e o que não deve ser feito, é o vosso
rosto com as diversas expressões que registrar. Sabeis o que dêle quereis,
e cada vez que a sua maneira de ser corresponde à vossa vontade — vosso olhar e
vosso sorriso lhe dizem: “Está bem!” Quando êsse bom sorriso e êsse olhar de
amor desaparecem, substituídos por uma expressão séria, a criança perceberá que
há “algo mal feito”. Na vossa própria, linguagem, se bem que não
compreenda ainda as palavras, há um sentido que ela aprende. Um tom de zanga e
um tom de carícia não são a mesma coisa para ela; as inflexões de vossa voz
reforçam singularmente o alcance do vosso sorriso ou da vossa sisudez.
Não
trateis nunca a criança como um brinquedo ou uma boneca. Ao fim de alguns
meses, ela participa de tal modo dos brinquedos oom os quais a distraímos, que
somos tentados a fazê-la brincar para que nós mesmos nos divirtamos. Nesse
momento, o adulto se arrisca a ultrapassar a medida. Não esqueçamos que o
sistema nervoso da criança é frágil e pode bem depressa fatigar-se. Por outro
lado, usam-se os recursos dos jogos de fisionomia que são a primeira linguagem
pela qual a criança compreende o adulto.
É um
contra-senso constranger uma criança a repetir 20 vêzes bom-dia à mesma pessoa,
sob o pretexto de instrui-la ou para divertir as galerias. As crianças gostam
de se conduzir como as pessoas grandes, mas detestam o papel de cães
amestrados. Se não detestassem, seria mais perigoso ainda porque significaria
que elas possuem alma de cabotino.
Evitai
falar ao vosso filho em linguagem de “bebê” ou em linguagem de “neguinho”, por
mais enternecedor que isso pareça. É um mau serviço que lhe prestamos imitar o
seu modo de exprimir-se. O benefício que lhe damos para o futuro é ensinar-lhe
o pronunciar de maneira correta a língua materna e corrigir-lhe as frases
defeituosas.
Colecionai
as palavras graciosas de vossos filhos, mas não as citeis jamais diante dêles.
Ê o que existe de pior para retirar da criança a frescura, de sua
espontaneidade e levá-la a considerar-se fenômeno interessante.
O
papel do pai, nos primeiros anos de existência dos filhos, é, e
certamente deve ser, mais apagado. Sem dúvida, êle pode manifestar aos filhos
a sua nascente ternura: o homem é, em geral, pouco afeito a manifestar
longamente tais sentimentos.
Que
por vêzes se ocupe dêle para que se habituem ao seu contato e para que se
habitue ao dêle, é bom. Mas, que não procure usurpar prematuramente o papel da
mãe, criando para si uma popularidade fácil. Não é, com efeito, o pai o
elemento nôvo que as crianças vêem menos do que a mãe, e que pode, por isso
mesmo, possuir atração particular? Que saiba, pois, apagar-se a cada instante,
em face dos filhos, deixando que a mãe assuma a parte principal.
É,
certamente, desejável que a forte autoridade que lhe é, eventualmente,
conferida pela fôrça física, o vigor de sua voz, possam às vêzes apoiar a
autoridade da mãe quando esta por fadiga se vê momentaneamente incapaz de ir
sozinha até o fim de sua tarefa educativa. Mas que isto aconteça o menos
possível, sobretudo diante dos que se encontram na primeira infância. A
desproporção de fôrças cria o mêdo nas crianças. O mêdo é o inconsciente que se
revela e é também a inibição das melhores faculdades. Não se educa (no sentido
pleno) com o mêdo. Parece-nos infinitamente preferível que a autoridade paterna
sc exerça indiretamente sob a forma de uma plena aprovação das decisões
maternas, pois as crianças são mestras consumadas na arte de encontrar uma
brecha na autoridade, de criar discordâncias, senão contradições. Isto não deve
ocorrer. Se o homem não concordar com sua mulher em tal ou qual caso, em face
dos filhos, que o diga a ela a sós, explicando-lhe as razões. Isto pode ser
muito útil: o homem que vê mais as coisas externas, que cm geral também vê mais
longe e mais amplamente, pode dar conselho útil à espôsa sob o ponto-de-vista
da educação; um conselho, dizemos, e não a amarga crítica que desencoraja, ou
a estéril zombaria.
Que o
pai evite as manifestações tonitroantes em que muitos encontram aparente
satisfação ao seu papel educativo; êle não deve ser máquina e fabricar grandes
observações, punições exemplares, tôda essa aparelhagem dramática e nefasta à
educação. Sua firme tranqüilidade e a clareza de uma reprimenda valerão por
vêzes muito mais do que uma atitude barulhenta de pai zangado. Que nunca faça
mêdo aos filhos. A violência dos gestos, a altitude extrema da voz, os olhares
faiscantes são quase sempre manifestações de um enervamento passageiro e sem
importância; sem importância para êle, adulto, mas que produz nos petizes
repercussões inesperadas e desastrosas.
Compete
a vós, mães, interessar vossos maridos na vida do pequenino. Longe de guardar
com zêlo para vós mesmas vossas descobertas e vossas intuições, revelai-as aos
vossos esposos, fazei com que êles se debrucem sôbre o despertar das faculdades
dos filhos e todos os sinais de seu desenvolvimento. Vossa confiança mútua se
beneficiará com o vosso esforço.
Nada
fará melhor aumentar a confiança de um marido em relação à sua mulher do que
sentir-se por ela ajudado a penetrar na intimidade secreta do serzinho todo
feito de enigmas, ao qual, juntos, deram a vida.
(COURTOIS, Pe. G., A Arte de Educar as Crianças de Hoje,
5ª edição, Agir, 1964)
Nenhum comentário:
Postar um comentário