Parasti in conspectu meo mensam adversus eos, qui
tribulant me — “Preparaste uma mesa diante de mim, contra aqueles que me
angustiavam” (Ps. 22, 5).
I. É com razão que a Santíssima Eucaristia foi
simbolizada pelo pão milagroso que o Anjo preparou para Elias; pois, assim como
o Profeta se sentiu de tal modo fortalecido, que pôde subtrair-se à fúria de
Jesabel e chegar ao monte do Senhor, assim os cristãos fortalecidos por este
pão divino terão força para vencer todos os formidáveis inimigos que lhes
estorvam o caminho da perfeição.
Diz São Cirilo de Alexandria, e confirma-o Santo
Tomás, que, “quando Jesus Cristo está dentro de nós, mitiga o ardor da nossa
concupiscência, acalma as inclinações desregradas da carne, e robustece a
piedade”. Este Sacramento, qual fonte de água, apaga o fogo das paixões que nos
consomem; por isso, quem se sentir abrasado pelo fogo de alguma paixão,
aproxime-se da Mesa sagrada e logo a paixão será morta ou amortecida. — Pelo
que dizia São Bernardo: “Meus irmãos, se alguém não sente tão freqüente nem tão
violentamente os movimentos da ira, da inveja, da incontinência, agradeça-o ao
Santíssimo Sacramento, que operou nele tão salutar mudança.”
Mais admirável ainda é a força que este alimento
divino nos comunica para vencermos o mundo com as suas vaidades. D´onde credes
que tiraram os primeiros cristãos aquela força heróica pela qual arrostavam a
perda de todos os bens e mesmo a vida, entre os tormentos mais cruéis? Da
recepção freqüente da santíssima Eucaristia: Erant perseverantes in
communicatione fractionis panis — “Eles perseveravam na comunhão do
partir do pão”. Foi ali também que todos os santos acharam a força para se
porem acima de todo o respeito humano.
Pelo seu entranhado amor a Jesus sacramentado, São
Wenceslau, rei da Bohemia, não se contentava com a comunhão freqüente nem com
as visitas repetidas do Santíssimo Sacramento, também durante as noites e no
mais rigoroso do inverno; mas com as suas próprias mãos colhia o trigo e as
uvas, preparava as hóstias e o vinho para uso no sacrifício da missa,
desafiando desta maneira o mundo, que não podia com os seus dictérios desviá-lo
daquela boa obra que ao pé dos altares ele resolvera praticar.
II. A santíssima Eucaristia mostra sobretudo o seu
poder irresistível em combater por nós e conosco o inferno e em repelir todos
os assaltos do demônio. O Doutor Angélico diz que os demônios, quando, pela santíssima
Eucaristia, nos vêem unidos e, por assim dizer, incorporados a Jesus, nosso
Chefe e Mestre, eles tremem, fogem e deixam de nos molestar, ou se ainda voltam
ao assalto, as tentações pouca força têm para nos vencer: Repellit omnem
daemonum impugnationem.
Acrescenta São João Crisóstomo que, vendo-nos
tintos com o sangue de Jesus Cristo na santa comunhão, os demônios põem-se em
fuga e os anjos acodem para nos fazer companhia. De tal modo que nos levantamos
da sagrada Mesa como leões, animados de um ardor santo, e longe de temermos os
espíritos infernais, somos para eles terríveis e formidáveis: Tamquam leones
ignem spirantes ab illa mensa surgamus, diabolo formidabiles. — Daí provém
essa profunda paz interior, essa forte inclinação para o bem, essa prontidão na
prática das virtudes, essa facilidade em andarmos no caminho da perfeição.
Portanto, meu irmão, se por desgraça te sentes
languido no bem, fraco no combate espiritual, acusa-te a ti próprio dizendo com
Davi: “Fui ferido como feno, e o meu coração se secou, porque me esqueci de
comer o meu pão” (1), que é a santíssima Eucaristia; e ao mesmo tempo toma
a resolução de seres mais diligente no futuro.
† “Eis aqui a que ponto chegou a vossa excessiva
caridade, ó meu amantíssimo Jesus! Vós me preparastes uma divina mesa com a
vossa carne e preciosíssimo sangue, para Vos dardes todo a mim. Quem pode
impelir-Vos a tais transportes de amor? Foi unicamente o vosso amorosíssimo
Coração. Ó Coração adorável do meu Jesus, fornalha ardentíssima do divino amor,
recebei na vossa sacratíssima chama a minha alma, para que, nesta escola de
caridade, aprenda eu a pagar com amor ao meu Deus que me deu provas tão
admiráveis de seu amor.” (2) — Fazei-o pelo amor de vossa e minha querida Mãe,
Maria. (*IV 294.)
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1. Ps. 101, 5.
2. Indulg. de 100 dias.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos
os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de
Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 290- 292.)
Fonte: São Pio V
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