Desideria
occidunt pigrum... qui autem iustus est tribuet, et non cessabit — “Os desejos
matam o preguiçoso; porém, o que é justo dará e não cessará” (Prov. 21, 25 26).
I.
Quem mais ama a Deus é mais santo. Dizia São Francisco Borges que a oração faz
entrar o amor divino no coração, ao passo que a mortificação dele remove a
terra e fá-lo apto a receber aquele fogo sagrado. Quanto mais espaço a terra
ocupa no coração, tanto menos lugar achará ali o santo amor: Sapientia... nec invenitur
in terra suaviter viventium (1) — “A sabedoria... não se acha na terra dos que
vivem em delícias”. — Por isso é que os Santos sempre procuraram mortificar, o
mais possível, o seu amor próprio e os seus sentidos. “Os santos são poucos,
mas devemos viver com os poucos, se nos quisermos salvar com os poucos”,
escreve São João Clímaco: Vive cum paucis, si vis regnare cum paucis. E São
Bernardo diz: “Quem quer levar vida perfeita, deve levar vida singular: Perfectum
non potest esse nisi singulare.”
Para
sermos santos, devemos, antes de mais nada, ter o desejo de nos tornarmos
santos: desejo e resolução. Alguns sempre desejam, mas nunca começam a por mãos
à obra. “De semelhantes almas irresolutas”, dizia Santa Teresa, “o demônio não
tem medo. Ao contrário, Deus é amigo das almas generosas.”
É,
pois, um engano do demônio, no dizer da mesma seráfica Santa, fazer-nos pensar
que há orgulho em se querer tornar santo. Seria orgulho e presunção se
metessemos a nossa confiança em nossas obras ou resoluções; mas não, se
esperamos tudo de Deus, que então nos dará a força que nos falta. — Desejemos,
portanto, e ardentemente, chegar a um grau sublime de amor divino e digamos com
coragem: Omnia possum in eo qui me confortat (2) — “Eu posso tudo naquele que
me fortalece”. Se não achamos em nós tão grande desejo, peçamo-lo instantemente
a Jesus Cristo, que não deixará de no-lo dar.
II.
Devemo-nos, portanto, alentar, tomar uma resolução e começar; lembrando-nos de
que, na perfeição cristã, segundo a expressão de São Francisco de Sales, vale
muito mais a prática do que a teoria. O que não podemos fazer com as nossas
próprias forças, ser-nos-á possível com o auxílio de Deus, que prometeu dar-nos
tudo o que Lhe pedíssemos: Quodcumque volueritis, petetis, et fiet vobis (3).
Ó
meu amado Redentor, Vós desejais o meu amor e me mandais que Vos ame de todo o
coração. Sim, Jesus meu, quero amar-Vos de todo o meu coração. Não, meu Deus —
assim Vos direi, confiado em vossa misericórdia, — não me assustam os pecados
que cometi, porque agora detesto-os e abomino-os mais do que qualquer outro
mal, e sei que Vos esqueceis das ofensas da alma que se arrepende e Vos ama.
Porque Vos ofendi mais do que os outros, quero, com o auxílio que de Vós
espero, amar-Vos mais do que os outros.
Senhor
meu, Vós me quereis santo, e eu quero tornar-me santo, não tanto para gozar no
paraíso, como para Vos agradar. Amo-Vos, bondade infinita! † Jesus, meu Deus,
amo-Vos sobre todas as coisas, e me consagro todo a Vós, vós sois o meu único
bem, o meu único amor. Aceitai-me, ó meu amor, e fazei-me todo vosso, e não
permitais que ainda Vos dê desgosto. Fazei com que eu me consuma todo por Vós,
assim como Vós Vos consumistes todo por mim. — Ó Maria, ó Esposa mais amável do
Espírito Santo, e a mais amada, obtende-me amor e fidelidade. Alcançai-me
somente, ó minha Mãe, que eu seja sempre vosso devoto servo; porquanto quem se
distingue na devoção para convosco, distingue-se também no amor a vosso divino
Filho. (II 400.)
----------
1.
Iob. 28, 13.
2.
Phil. 4, 13.
3.
Io. 15, 7.
(Santo Afonso Maria de Ligório.
Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Primeiro: Desde o primeiro
Domingo do Advento até Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia,
1921, p. 360-362.)
FONTE: São Pio V
Nenhum comentário:
Postar um comentário