SOBRE A PERDA DE JESUS NO TEMPLO
Segundo
a narração de S. Lucas, Maria e José iam cada ano a Jerusalém para a festa da
Páscoa, e levavam consigo a Jesus Menino. Nessas circunstâncias, ao menos na
volta, os homens e as mulheres iam separadamente; assim exigia o costume dos
hebreus, observa o Venerável Beda; e as crianças acompanhavam à vontade o pai
ou a mãe. Quando Nosso Senhor chegou à idade de doze anos, sucedeu-lhe ficar em
Jerusalém durante três dias após a solenidade, julgando Maria estivesse ele com
José, e José que estivesse com Maria.
O
santo Menino passou todos esses três dias honrando a seu Pai eterno com jejuns,
vigílias, preces, e com a assistência aos sacrifícios, que eram outras tantas
figuras do grande sacrifício que Ele devia oferecer na cruz. Se é que então
tomou algum alimento, diz S. Bernardo, teve de mendigá-lo; e se tomou algum
repouso, não teve outro leito que a terra nua.
Chegada
a tarde, Maria e José notam com dor a ausência de Jesus. Põem-se a procurá-lo
entre os seus parentes e amigos, mas em vão. Voltam em fim a Jerusalém, e ao
terceiro dia o encontram no templo a disputar com os doutores, espantados e
cheios de admiração ao ouvirem as perguntas e as respostas daquele Menino
extraordinário.
Não há na
terra pena semelhante à duma alma que ama a Jesus, e que teme Jesus se tenha
dela apartada por causa dalguma falta.
Tal foi a extrema aflição de Maria e José naqueles três dias em que foram
privados da presença de Jesus; como diz o devoto Lanspérgio, a sua humildade
lhes fazia temer terem-se tornado indignos de guardar tão precioso tesouro. Eis
por que, ao revê-lo, Maria lhe disse com ternura: Meu Filho, por que fizestes
assim conosco? vosso pai e eu vos procurávamos com o coração repleto de dor. —
Não sabíeis, respondeu-lhe Jesus, que devo ocupar-me das coisas que são do
serviço de meu Pai?
Aprendamos
duas coisas desse mistério: a primeira, que devemos abandonar tudo,
amigos e parentes, quando se trata de trabalhar para a glória de Deus; a segunda,
que Deus se
faz achar por aqueles que o procuram.
Afetos e Súplicas.
Ó
Maria, chorais porque perdestes vosso Filho durante alguns dias. Ele afastou-se
dos vossos olhos, mas não do vosso coração: não vedes que o puro amor de que
estais por Ele abrasada, o conserva estreitamente unido a vós? Sabeis que quem
ama a Deus não pode deixar de ser amado por Deus, que disse: Amo os que me amam,
e pelos lábios de S. João: Quem permanece na caridade, permanece em Deus, e
Deus nele. Que temeis, pois? por que chorais? Deixai as lágrimas para mim, que
tantas vezes perdi a Deus por minha culpa expulsando-o da minha alma!
Ah!
meu Jesus, como pude ofender-vos deliberadamente, sabendo que pelo pecado eu
vos perdia? Mas não quereis que desespere um coração que vos procura; mas, ao
contrário, que se alegre. Se outrora me afastei de vós, ó meu amor, agora eu
vos procuro, e só procuro a vós. Contanto que possua a vossa graça, renuncio a
todos os bens e a todos os prazeres da terra, renuncio mesmo à vida. Dissestes
que amais os que vos amam; eu vos amo, amai-me pois também. Prefiro o vosso
amor à posse do mundo inteiro. Meu Jesus, não quero mais perder-vos; mas não
posso contar com minhas próprias forças, ponho em vós toda a minha confiança. É
em vós, Senhor, que espero; não serei confundido eternamente. Por favor,
prendei-me a vós e não permitais me suceda ainda separar-me de vós.
Ó
Maria, que me fizestes tornar a encontrar o meu Deus, que eu perdera,
obtende-me ainda a santa perseverança. Digo também a vós com S. Boaventura:
“Espero em vós, Soberana minha, e não serei confundido eternamente”.
(Aqui termina a última postagem das meditações para o tempo da Epifania).
(Encarnação, Nascimento e Infância de Jesus Cristo – Santo Afonso
Maria de Ligório)
(Grifos nossos)
Nenhum comentário:
Postar um comentário