Muitos
fiéis estão assustados e perplexos diante do que está sendo dito a respeito dos
Bispos da Resistência. Seriam eles liberais? Estariam eles, ao menos,
escorregando para o lado liberal e modernista?
Vejamos
alguns pontos controvertidos: duas Igrejas entrelaçadas, frutos metade bons,
metade maus; piedade na Missa Nova.
Duas
Igrejas entrelaçadas que podem ser distinguidas mas não separadas. Que sentido
pode haver nesta frase? O que pode haver de comum entre a luz e as trevas,
entre Cristo e Belial? A questão é mais simples do que parece. Não pode haver
nada de comum entre a doutrina modernista e a doutrina católica, já que o
modernismo é a negação do catolicismo. Mas quando um membro do clero e sobretudo
os Bispos e o próprio Papa se tornam modernistas, eles fazem violência à Igreja
e realizam uma união adúltera entre o seu caráter sagrado de ministros de Deus
e uma doutrina que é contra este caráter sagrado. Entrelaçada, ou melhor, atada
pelos seus próprios ministros, como Nosso Senhor preso e atado pelos que
deveriam recebê-Lo como Messias e adorá-Lo como o Filho de Deus, consubstancial
ao Pai e ao Espírito Santo.
Gustavo
Corção já havia falado de duas Igrejas e um só Papa, ao contrário do que se
sucedeu no Grande Cisma quando havia uma só Igreja e três Papas.
Mas
como pode haver frutos metade bons, metade maus? Uma árvore má dá maus frutos e
uma árvore boa dá bons frutos. Um fruto é bom ou é ruim. Ponto final.
Infelizmente
a realidade é mais complexa. Santo Tomás diz que a árvore má é a vontade
perversa. Uma vontade perversa não pode dar frutos bons, mas o mesmo homem
pode, ora dar frutos bons, ora dar frutos maus, pois o mesmo homem pode pecar
como São Pedro pecou e se arrepender como São Pedro se arrependeu. O mesmo
homem pode ter uma vontade perversa e, tocado pela graça, pode ser justificado
e vir a ter uma vontade boa.
Mas
dirão: não é isso que foi dito. Como pode um fruto ser metade bom, metade mau?
Tudo o que apodrece supõe algo que não era podre. Logo supõe algo de sadio. O
que vemos hoje é a lenta corrupção da sã doutrina, dos bons costumes, dos
sacramentos, etc, etc. A causa desta corrupção é má pois procede do demônio, do
mundo e da carne. O resultado desta corrupção será mais ou menos avançado
segundo cada pessoa.
Passemos
à consideração de alguns fatos históricos que podem ser úteis no exame desta
realidade da coexistência de bem e de mal, de metade bom e metade mau.
No
século XIX, Pio IX disse que os piores inimigos da Igreja eram os católicos
liberais. Monsenhor Dupanloup era um católico liberal. Ele era Bispo de
Orleans. Pio IX não o destituiu. Pio IX não o excomungou. Monsenhor Dupanloup
não fez só coisas ruins. Creio que foi ele que pediu a introdução do processo
de canonização de santa Joana d'Arc. Nisto ele agiu bem. Foi ele também que se
opôs, com outros Bispos, à definição da infalibilidade pontifícia. Nisto agiu
mal. Agiu como um liberal, inimigo das definições infalíveis. Metade bom,
metade mau. Pior inimigo da Igreja, porque, estando dentro dela, lhe faz mais
mal do que os que estão fora. Mas, mesmo assim, mantido no seu cargo por Pio
IX, porque fazia algum bem, apesar de tudo, ou porque destituí-lo causaria mais
mal do que bem.
Alguns
pensarão talvez que Pio IX agiu mal. Mas são Pio X fez o mesmo com os
modernistas. Ele excomungou apenas alguns. Outros, simpatizantes do modernismo,
ele tolerou. Eram simpatizantes do modernismo em maior ou menor grau. são Pio X
tentou convertê-los. Chamou a atenção. Corrigiu-os, mas não retirou o cargo nem
ao Cardeal Maffi, nem ao Cardeal Ferrari, Arcebispo de Milão. Pio IX foi mais
severo (injusto, para falar a verdade) com o excelente Cardeal Billot do que
são Pio X com estes dois prelados mais ou menos atingidos pelo modernismo. Por
que? Porque são Pio X certamente via algum bem nesses cardeais. Metade bom,
metade mau. Algum bem, ao menos, em deixá-los em seus cargos. Um bem relativo e
um mal também. Uma mistura de bem e de mal.
São
Paulo ensina que há dois homens em nós: o velho e o novo. Mesmo quando o novo
toma o lugar do velho no dia do batismo, as feridas do pecado original
permanecem, lembrando-nos nossa origem em Adão. É o combate espiritual que
durará toda nossa vida.
Enfim
a piedade na Nova Missa. É isto possível? Mas falar disso é ser progressista,
modernista, liberal? Não. É um fato. Há padres e há fiéis que rezaram ou
assistiram a Missa Nova com piedade. Ao menos, pode-se pensar que o fizeram.
Cito um caso que conheci: Gustavo Corção. Alguns seminaristas da Fraternidade
São Pio X também a assistiram no início dos anos 70, pelo que se deduz
escutando as conferências de Dom Lefebvre dadas em Ecône. Suponho que o fizeram
com piedade.
Mas
dizer isso é favorecer a Missa Nova! Não. Dizer isso é dizer uma verdade.
Verdade que mostra a profundidade do drama que vivemos nesta terrível crise. O
bem e o mal perdem sua nitidez na alma de muitos. Guardar esta nitidez é uma
graça. Saber que outros não a tem é sabedoria. A sabedoria é necessária para
auxiliar as almas e para retirá-las deste caos. Possa Deus nos fazer a graça de
contribuir em esclarecer as que são vítimas desta desorientação diabólica da
qual falou a irmã Lúcia.
Dom
Tomás de Aquino, OSB.
Fonte: Nossa Senhora das Alegrias
Fonte: Nossa Senhora das Alegrias
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