Pratica-se o jejum para
ajudar a resistir as tentações
1. Primeiro, para reprimir as concupiscências da carne. Donde o dizer o Apóstolo (2 Cor 6, 5): «Nos jejuns, na necessidade», porque o jejum conserva a castidade. Pois, como diz Jerônimo, «sem Ceres e Baco Vênus esfria», i. é, pela abstinência da comida e da bebida a luxúria se amortece.
2. Segundo, praticamos o jejum para mais livremente se nos elevar a alma na contemplação das sublimes verdades. Por isso, refere a Escritura que Daniel (Dn 10), depois de ter jejuado três semanas, recebeu de Deus a revelação.
3. Terceiro, para satisfazer pelos nossos pecados. Por isso, diz a Escritura (Jl 2, 12): «Convertei-vos a mim de todo o vosso coração em jejum e em lágrimas e em gemido». E é o que ensina Agostinho num sermão: «O jejum purifica a alma, eleva os sentidos, sujeita a carne ao espírito, faz-nos contrito e humilhado o coração, dissipa o nevoeiro da concupiscência, extingue os odores da sensualidade, acende a verdadeira luz da castidade».
O jejum é objeto de preceito. Pois o jejum é útil para delir e coibir as nossas culpas e elevar-nos a mente para as coisas espirituais. Ora, cada um está obrigado, pela razão natural, a jejuar tanto quanto lhe for necessário para conseguir tal fim. Por onde, o jejum, em geral, constitui um preceito da lei natural. Mas, a determinação do tempo e do modo de jejuar, conforme à conveniência e à utilidade do povo Cristão, constitui um preceito de direito positivo, instituído pelos superiores eclesiásticos. E tal é o jejum da Igreja, diferente do jejum natural.
Os tempos de jejum estão convenientemente determinados pela Igreja. O jejum é ordenado por dois motivos: para delir a culpa e para nos elevar a mente às coisas espirituais. Por isso, os jejuns foram ordenados especialmente naqueles tempos em que, sobretudo, devemos os fiéis nos purificar dos pecados e elevar a mente a Deus pela devoção. O que sobretudo se dá antes da solenidade Pascal, quando as culpas são delidas pelo batismo, celebrado solenemente na vigília da Páscoa, em memória da sepultura do Senhor; pois, pelo batismo, somos sepultados com Cristo para «morrer ao pecado», na frase do Apóstolo (Rm 6, 4). E também na festa Pascal devemos, sobretudo, pela devoção, elevar a mente à glória da eternidade, a que Cristo deu começo pela sua ressurreição. Por isso, imediatamente antes da solenidade Pascal, a Igreja nos manda jejuar; e pela mesma razão, nas vigílias das principais festividades, quando devemos nos preparar devotamente para celebrar as festas que se vão celebrar.
Jejum por Padre Júlio Maria
A Igreja, ciosa de seguir em
tudo as prescrições e os conselhos do Divino Mestre, prescreveu o jejum e a
abstinência, como penitência, em certos dias do ano.
O jejum consiste em
privar-se de uma parte dos alimentos habitualmente usados, e refere-se à quantidade do
mesmo alimento.
A abstinência consiste em
privar-se de carne em certos dias, por espírito de penitência, e refere-se,
pois, à qualidade do alimento.
Jesus Cristo prescreve o
jejum sem indicar o dia deste jejum; aconselha esta prática como meio de
alcançar o perdão das faltas, de expiá-las e de domar as paixões da carne. Tudo
isto está claramente indicado na Bíblia.
Não tendo Jesus indicado o
tempo, nem o dia destas penitências, cabe à Igreja determiná-los, para que os
conselhos e preceitos do Salvador não fiquem esquecidos.
Percorramos, meu caro
crente, os exemplos, os conselhos e preceitos do jejum, indicando bem
os passos, para que o amigo os possa verificar em sua Bíblia.
II – Preceito do jejum: Digo
logo, para espantar o meu amigo crente, que o jejum constitui não simplesmente
um conselho ou uma lei eclesiástica, mas sim uma lei divina, como a oração e
a esmola.
A prova é simples: o que
Jesus Cristo une num mesmo preceito, deve possuir a força deste preceito. Ora,
lemos em S. Mateus que o Salvador fez três preceitos para cumprir a lei e as
profecias: esmola, oração e jejum.
O capítulo VI de S. Mateus é
a majestosa exposição desta verdade. Jesus Cristo diz ao terminar: Quando
jejuardes, não vos mostreis tristes... Ungi as vossas cabeças e lavai o vosso
rosto... para não parecer aos homens que jejuais, mas a vosso Pai, que vos
recompensará (16,17,18).
Em outro lugar o Salvador
ensina que há tentações, que só se combatem à força de oração e do jejum (Mt
17, 20).
Ora, todos nós somos
tentados. Todo homem é tentado pela sua própria concupiscência, diz S.
Tiago (1, 14). Para resistir a estas tentações precisamos, pois, recorrer à
oração e ao jejum.
Eis já o quanto é claro e
irrefutável.
Examinemos agora se o tal
preceito foi praticado pelo próprio Salvador.
III – Exemplo de Jesus
Cristo: O grande modelo a imitar é Jesus Cristo. Ele é o caminho: Ego sum
via veritas et vita (Jo 14,6). Ora, lemos em S. Mateus que antes de
iniciar a sua grande obra – a fundação da Igreja – o Salvadorfoi conduzido ao
deserto, onde jejuou durante quarenta dias e quarenta noites (Mt 4,1-2).
Como é que os amigos
protestantes, que pretendem seguir a Bíblia à risca, não imitam a Jesus Cristo
jejuando, em vez de atacarem o jejum praticado pelos católicos, em imitação do
seu divino modelo? Que contradição! A Bíblia está repleta de exemplos de jejum.
Em toda parte, em todas as necessidades encontramos a oração e o jejum,
como duas práticas inseparáveis, para aplacar a Deus e obter os seus
benefícios.
O jejum é como o sustento da
oração. É boa a oração acompanhada do jejum, diz Tobias (12,8). Voltei meu
rosto para o Senhor, meu Deus, para o rogar, o conjurar em jejuns, diz Daniel
(9,3-4).
O ímpio Acab, provocando a
justiça de Deus, por causa da vinha de Nabot, jejuou coberto de um
cilício e alcançou certa indulgência.
Os ninivitas, urgidos que fizessem
penitência, observavam o jejum, para alcançarem a clemência de Deus, etc., etc.
IV – A origem da
quaresma: A quaresma, ou os quarenta dias de jejum, praticados na Igreja
Católica, foi instituída pelos Apóstolos, em lembrança do Jejum de Jesus
Cristo.
A prova desta asserção
encontra-se na regra traçada por Santo Agostinho: “Toda prática, diz ele,
recebida por toda a Igreja e cuja origem não pode ser atribuída nem a um bispo,
nem a um papa, nem a um concílio, deve ser considerada como uma instituição
apostólica.”
Ora, a quaresma foi sempre
observada por todas as nações cristãs e não se pode fazer remontar a sua origem
a uma instituição humana, posterior ao tempo dos apóstolos; logo foi instituída
por eles.
Os amigos protestantes dizem
que tal prática foi instituída pelo Concílio de Nicéia. É falso, pois o
Concílio de Nicéia realizou-se em 325, e encontramos já nos escritos de
Tertuliano e de Orígenes, no ano 200, a menção positiva da quaresma.
S. Jerônimo, no ano 400,
escreveu: “Segundo a instituição apostólica, observamos um jejum de 40 dias.”
(Ep. ad Marcel. ).
S. Leão é mais positivo
ainda: “Foram os apóstolos, -diz ele- que, por inspiração do Espírito Santo,
estabeleceram a quaresma.”
“Jejuamos em qualquer outro
tempo, - diz também S. Agostinho- se quisermos, mas durante a quaresma, pecamos
se não jejuamos”.
Eis, pois, bem demonstrado
que a quaresma é uma instituição dos Apóstolos, instituída por eles, talvez por
ordem ou conselho de Jesus Cristo, para lembrar e imitar o jejum de 40 dias do
próprio Salvador.
V – O jejum na antiga e nova
lei: O jejum da sexta-feira, como já disse, não existe senão na cabeça do
protestante à cata de objeções; mas se existisse, teria inda a sua razão de
ser, o seu fundamento. Este fundamento seria a Lei da Igreja.
A Sagrada Escritura prova a
necessidade do jejum, sem determinar os dias deste jejum. Os apóstolos
instituíram a quaresma. A Igreja de Jesus Cristo possui uma autoridade divina,
igual à autoridade dos apóstolos, pois o papa é o legítimo sucessor dos
apóstolos. É, pois, inegável que o Papa possa prescrever jejuns ou suprimí-los,
em certos dias, para um fim útil ou conveniente. O jejum, como mortificação do
corpo, é um preceito divino; o modo prático de exercê-lo deve ser
regulamentado pela Igreja, por lei eclesiástica, que obriga a consciência.
A Igreja recebeu do seu
divino Fundador o poder de legislar, ou formar leis; tal poder pertence
necessariamente àautoridade de governar que S. Pedro recebeu do Salvador: Dixit
ei (Pedro): Pasce oves meas (Jo 21,17).
Não se pode negar este poder
à autoridade eclesiástica, tanto mais que a antiga lei dava tal poder a seus
chefes, como lemos na Bíblia.
Jozafaz fez publicar um
jejum em toda a Judéia, o que foi aprovado pelo Senhor, que lhe concedeu o
favor implorado.
Esdras publicou também um
jejum pela feliz jornada dos judeus que voltaram do cativeiro da Babilônia. Publiquei
um jejum, diz ele; nós jejuamos, pois, e tudo nos sucedeu com felicidade (1Esd
8,21-23).
Jeremias publicou igualmente
um jejum em Jerusalém, para toda a multidão que vinha de Judá, a fim de aplacar
as vinganças do Senhor (Jer 36,9).
O profeta Zacarias faz
menção de quatro jejuns, ordenados por Deus (Zac 3,19).
Eis como a Igreja do Antigo
Testamento preceituava o jejum e determinava o tempo e o modo de praticá-lo,
por ordem divina. É, pois, lógico que a Igreja do Novo Testamento goze do mesmo
poder de que gozava a Igreja antiga, que era apenas o esboço, o símbolo e a
Imagem da Igreja de Cristo.
VI – A abstinência de carne: Devemos,
pois, concluir que a Igreja tem o direito de impor, em certos dias
determinados, o dever de jejuar e de abster-se de certos alimentos
por lei positiva do poder eclesiástico.
Se tem o poder de prescrever
o jejum, deve ter também o de prescrever a abstinência de certos
alimentos. Tal abstinência não é novidade; existiu na lei antiga, como existe
hoje na Igreja Católica.
Os próprios apóstolos
prescreviam tal abstinência. Abster-vos-ei das carnes sacrificadas aos
ídolos, do sangue e dos animais sufocados, dizem os Atos (15,29).
Se os apóstolos prescrevem
de abster-se de certas carnes, podem naturalmente prescrever tal abstinência em
tempo e dias marcados, como fez a Igreja, prescrevendo em certos países a
abstinência de carne, nas sextas-feiras, em lembrança da morte do divino
Salvador. É claro, simples e incontestável.
VII – Conclusão: A conclusão
é irrefutável. A Igreja Católica, fiel aos ensinamentos da Bíblia, apóia-se em
todas as suas doutrinas sobre o texto sagrado, e faz dele o pedestal divino dos
dogmas, da moral, e até das cerimônias do culto.
O protestantismo, ao
contrário, limita-se em exaltar a Bíblia, e na prática afasta-se completamente
dos ensinos da mesma Bíblia. Jejuar e abster-se de certos alimentos é uma
prática que vem do berço da humanidade: pouco importa que o protestante
proteste, porque a sua lei, a base do seu credo é protestar contra a
verdade católica.
Se a Igreja proibisse o
jejum e a abstinência, os amigos protestantes citariam centenas de textos para
provar que o jejum e a abstinência são preceitos divinos. E estes textos podem
ser encontrados, de fato.
A Igreja, firme em sua
resolução divina, sustenta a verdade; e o protestante, embora não encontra nenhum
texto, absolutamente nenhum, contra o jejum e a abstinência, protesta e quer
ver textos que provem que se deve jejuar nas sextas-feiras.
Pe. Júlio Maria De
Lombaerde, "Luz nas Trevas". Págs. 202-208
Fonte Escravas de Maria
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