(Os sete Sacramentos) |
Parece que não é lícito fazer nenhum acréscimo às palavras nas quais consiste a forma dos sacramentos.
1.
— Pois, não impõem menor necessidade essas palavras sacramentais que as
da Sagrada Escritura. Ora, às palavras da Sagrada Escritura não é
lícito acrescentar nem diminuir nada. Assim, diz a Escritura: Vós não ajuntareis nem tirareis nada às palavras que eu vos digo. E noutro lugar: Eu
protesto a todos os que ouvem as palavras da profecia deste livro. Que
se alguém lhe ajuntar alguma causa, Deus o castigará com as pragas que
estão escritas neste livro; e se algum tirar qualquer causa, tirará Deus
a sua parte do livro da vida. Logo, parece que também à forma dos sacramentos não é lícito fazer nenhum acréscimo ou diminuição.
2.
Demais. — As palavras desempenham, nos sacramentos, o papel de forma,
como se disse. Ora, qualquer adição ou subtração varia a espécie da
forma como também se dá com os números, no dizer de Aristóteles. Logo,
parece que se fizer algum acréscimo ou subtração à forma do sacramento,
já este não será o mesmo.
3.
Demais. — Assim como a forma do sacramento requer um número determinado
de palavras, assim também uma ordem determinada delas e mesmo a
continuidade da oração. Se pois, a adição ou a subtração não elimina a
realidade do sacramento, parece que, pela mesma razão, não a elimina
nem a transposição das palavras nem a interpolação na pronúncia.
MAS, EM CONTRÁRIO, nas formas dos sacramentos, uns fazem certos acréscimos que outros não fazem. Assim os latinos batizam sob esta forma — Eu te batizo em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo; ao passo que os gregos, sob est'outra — Seja batizado o servo de Cristo N. em nome do Padre, etc.
E, contudo ambos conferem verdadeiramente o sacramento. Logo, é lícito
fazer acréscimos ou diminuições nas formas dos sacramentos.
SOLUÇÃO.
— Acerca de todas as mudanças que podem ocorrer nas formas dos
sacramentos, duas coisas devemos considerar. — Uma relativa a quem
profere as palavras, cuja intenção é necessária à existência do
sacramento, como a seguir se dirá. E assim, se tiver a intenção, por
essa adição ou subtração de introduzir outro rito que não o recebido
pela Igreja, não perfaz o sacramento, por não ter a intenção de fazer o
que faz a Igreja. — A outra causa a considerar é relativa à significação
das palavras. Pois como as palavras operam, nos sacramentos, pelo
sentido que fazem, conforme dissemos devemos considerar se a referida
alteração tira às palavras o sentido próprio, porque então é manifesto
que elimina a realidade sacramental.
Ora,
é manifesto que, feita uma diminuição na substância da forma
sacramental, desaparece o sentido próprio das palavras e portanto não se
perfaz o sacramento. Por isso Dídimo diz: Quem pretender batizar,
mas omitindo uma das referidas palavras, isto é, do Padre, do Filho e
do Espírito Santo, não batiza completamente. Mas se a subtração for
do que não é da substância da forma, essa diminuição não tira o sentido
próprio das palavras e por conseqüência não priva o sacramento da sua
perfeição. Assim, na forma da Eucaristia, que é — Este pois é o meu
corpo — o vocábulo pois, eliminado, não exclui o sentido próprio das
palavras e portanto não priva o sacramento da sua perfeição. Embora
possa dar-se que quem o omitiu peque por negligência ou desprezo.
Quanto
à adição, sucede o fazer-se um acréscimo corruptivo do sentido próprio;
assim se alguém dissesse modo de batizar dos Arianos: Eu te batizo em nome do Padre maior e do Filho menor.
E então esse acréscimo elimina a verdade do sacramento. Mas se o
acréscimo for tal que não faça desaparecer o sentido próprio, não
desaparece a realidade sacramental. Nem importa se essa adição se faça
no princípio, no meio ou no fim. Assim, se disser — Eu te batizo em nome
de Deus Padre onipotente e do seu Filho Unigênito e do Espírito Santo
Paráclito, haverá verdadeiramente batismo. E semelhantemente, se disser
— Eu te batizo em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo, e a
Santa Virgem te ajude, haverá verdadeiramente batismo.
Talvez,
porém se dissesse — Eu te batizo em nome do Padre e do Filho e do
Espírito Santo e da Santa Virgem Maria — não haveria batismo, porque
diz o Apóstolo: Porventura Paulo foi crucificado por vós? Ou haveis sido batizados em nome de Paulo?
E isto é verdade se entender o ser batizado em nome da Santa Virgem,
como se o fosse em o da Trindade, pelo qual foi o batismo consagrado;
pois, tal sentido seria contrário à verdadeira fé e por consequência
excluiria a realidade do sacramento. Se porém se entender o acréscimo —
em nome da Santa Virgem — como significando não que o nome da Santa
Virgem tenha qualquer operação no batismo, mas que a sua intercessão
seja útil para o batizado conservar a graça batismal, não desaparece a
perfeição do sacramento.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Às palavras da Sagrada Escritura não é
lícito fazer nenhum acréscimo, quanto ao sentido delas; mas para
explicá-las, os doutores lhes ajuntam muitas outras. Mas, essas não se
lhes podem acrescentar como se considerassem partes integrantes delas,
porque haveria então o vício da falsidade. E semelhantemente, se alguém
dissesse ser de necessidade para a existência da forma o que não o é.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — As palavras pertencem à forma do sacramento em razão do
sentido significado. Por isso, qualquer acréscimo ou subtração de
palavras, que nada acrescente ou subtraia ao sentido próprio, não
elimina a espécie do sacramento.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Se a interrupção das palavras for tão grande que
intercepte a intenção de quem as pronuncia, desaparece o sentido do
sacramento, e por consequência a sua realidade. Mas não desaparece,
quando a interrupção, sendo pequena não faz interromper a intenção
mental. — E o mesmo se deve dizer da transposição das palavras. A qual,
destruindo o sentido da locução, não se perfaz o sacramento; tal o caso
da negação preposta ou posposta ao sinal. Se porém a transposição for
tal que não altere o sentido da locução, não desaparece a realidade
sacramental; pois, segundo diz o Filósofo, os nomes e as palavras
transpostas significam o mesmo.
(Suma Teológica, III part., q. 60, a. 8)
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