Padre
Emmanuel de Gibergues
Após o dever de dar a vida, vem
o dever de engrandecê-la, o dever da educação. Não é exagero dizer que é
uma obra divina. Educar, educere, significa elevar o homem, tirá-lo do
pecado original, em que está mergulhado por sua natureza; arrancá-lo das
trevas, das servidões, das incapacidades, das humilhações, das paixões de sua
natureza decaída, da escravidão do demônio, para revesti-lo de Jesus Cristo,
para elevá-lo a pouco e pouco, esclarecê-lo, formar o seu espírito e coração,
torná-lo vencedor de suas paixões e senhor de si mesmo, fazer dele um homem
honesto, um cristão, quiçá um santo; completar nele, enfim, a semelhança divina
à qual foi criado, conduzindo-o ao estado e grau de perfeição que Deus lhe
destinou e, finalmente, ao lugar da sua morada eterna.
Eis a educação! é bem a obra de
Deus, a obra criadora, porque Deus havia criado o homem perfeitamente educado,
“a justiça e santidade da verdade” é a obra redentora, sobretudo, porque o
pecado, tendo destruído a educação original do homem, foi preciso que Jesus
Cristo a restabelecesse na dor e no sangue; e a continuasse todos os dias, em
cada um de nós, pela graça e pelos sacramentos.
A educação é a própria obra de
Jesus Cristo sobre a terra; os pais são os Seus continuadores e auxiliares; é a
obra por excelência!
Mas, ai! como são raros os que
pensam neste dever ou que desejam cumpri-lo! Não se preparam para isto. A
educação é uma obra eminentemente difícil. Não só requer dedicação, mas muito
tato, saber, experiência e observação. Quais são os rapazes e raparigas que
pensam seriamente nisto, antes do seu casamento e se preparam eficazmente? ...
Preparai vossos filhos e vossas
filhas; meus senhores, para serem educadores. Preparam-se para serem oficiais,
magistrados, professores, industriais, sábios; preparam-se para todas as
funções sérias, durante anos de trabalho, e porque os futuros pais e as futuras
mães se não hão de preparar para a mais difícil de todas as tarefas; - a
educação?
Não se preparam porque não se
querem incomodar com isto. Logo que as crianças nascem confiam-nas a cuidados
mercenários; assim que podem, para se verem livres deles, colocam-nos em
colégios, ou os abandonam sem fiscalização a professores ou a professoras; e
continuam a vida de prazeres, de festas, a vida mundana e egoísta.
Os enjeitados têm a caridade
para recebê-los; têm religiosos ou religiosas que lhes servem de admiráveis
pais e de extremosas mães. Há crianças de famílias ricas, de famílias que se
dizem cristãs, que não são tão bem tratadas e que, seus pais, para livremente
se divertirem as confiam a criados que, na maior parte dos casos, as corrompem
e depravam.
Naturalmente, nem um pai nem uma
mãe se devem isolar da sociedade, mas é necessário que o tempo que deve ser
empregado nos cuidados e educação dos filhos, não seja absorvido pelos
entretenimentos e outras preocupações mundanas.
O contrário significa um
abatimento moral, o desprezo do maior dever dos pais, cuja desordem e
infelicidade não se poderiam lastimar bastante, e recear as consequências
perniciosas.
Mas supondo um pai que
compreenda a gravidade do seu dever e esteja preparado para cumpri-lo, decidido
a fazer os sacrifícios necessários, a trabalhar quanto for necessário,
seriamente, pessoalmente, na educação de seus filhos; que deverá fazer?
Tudo se pode resumir nos pontos
seguintes: a correção, a religião, o exemplo, apreservação, a última educação,
o futuro.
O dever de correção é
consequência imediata da queda original.
O homem não nasce naturalmente
bom, como afirma Rousseau: nasce mau, depravado, com uma vontade propensa para
o mal, com terríveis paixões em gérmen; em uma palavra, com o que a Igreja
chama a concupiscência, que o batismo, tornando-o filho de Deus, enfraquece,
contrabalança, mas não suprime. São estes instintos perversos que a correção combate,
ou antes, ensina à criança a combater por si mesma. Visto não os poder suprimir
e não dever ceder-lhes, será preciso que os domine, para vencê-los mais tarde.
A correção exige do pai e da mãe quatro qualidades: a perspicácia, a firmeza,
a bondade e a concórdia mutua.
A correção exige a perspicácia porque
é uma obra de luz e de sapiência, em que, primeiro que tudo, é preciso ver
lucidamente.
É preciso conhecer-se bem o fim
proposto; necessitam-se idéias nítidas; princípios sólidos, e pensar em educar
as crianças para Deus e não para si mesmo. Se os pais não estão certos do que
creem ou querem, como poderão corrigir seus filhos?
É preciso conhecer nas próprias
crianças o que elas são; pois que nem todas são semelhantes; as suas naturezas
físicas e morais são essencialmente diferentes. Tratá-las todas do mesmo modo,
é um engano e um erro.
É preciso estudar, em especial,
a natureza de cada criança; o seu caráter, as suas qualidades, os seus
defeitos, para se saber como se há de tratar, o que se poderá exigir de dela, a
medida de esforços de que poderá dispôr, o que ela tem de mais importante a
combater ou a desenvolver.
Para isto, é necessário força de
vontade para ver sem paixão; porém, bem poucos pais são capazes de assim
proceder em virtude da cegueira a que os leva a afeição natural. Diz-se que a
cegueira das mães, no que diz respeito às filhas, não se pode comparar senão à
cegueira dos maridos, no que diz respeito a suas mulheres. Pode dizer-se o
mesmo, dum modo geral, da cegueira dos pais para com seus filhos; é profunda e
como incurável. Os educadores sabem-no e lamentam-no; os mais ilustres têm-no
afirmado mais de cem vezes.
Os pais defendem os filhos quando os mestres os
repreendem, e dão razão aos filhos. Muito poucos pais querem reconhecer os
defeitos dos filhos, saber a verdade a seu respeito. Com a perspicácia desaparece
esta cegueira da alma e morrem todas as suas ilusões. É o fruto do verdadeiro
amor: illuminatos oculos cordis1. A correção é obra de luz, requer a
perspicácia.
1- Epístola aos Efésios: I 18.
"Os olhos esclarecidos do coração."
Fonte: A Grande Guerra
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