Padre Júlio Maria, C.SS.R.
O Deus desprezado, ano de edição
1932.
Convençamo-nos os padres:
não conseguiremos santificar os fiéis, converter os ímpios, regenerar as
paróquias, exaltar o catolicismo no Brasil sem que o povo veja em nós amor
efetivo a Jesus Cristo.
Santo Afonso Maria de Ligório,
homem que não só pelas suas virtudes, como também pelos seus talentos de
teólogo e escritor, Soberanos Pontífices declararam suscitado por Deus para a
regeneração de uma época, não julgava possível aos seus missionários a
conversão das almas sem o amor do Santíssimo Sacramento, cuja devoção, que lhes
tornou obrigatória, diz ele, de todas a mais agradável a Deus, a mais abundante
em frutos, a mais prática em resultados.
Não há uma só congregação, das
que se destinam a salvação das almas pelo ensino e pregação, na qual o culto do
Santíssimo Sacramento não seja considerado o meio eficacíssimo de dar ao seu
apostolado zelo, fervor e unção.
Como pode nas nossas paróquias o
clero secular, desarmado do recolhimento, da mortificação, das penitências, que
fortificam os religiosos; e lhes são muito fáceis, levar a efeito a grande obra
da salvação das almas sem o poderoso e soberano auxílio desse culto, de que os
religiosos julgam não poder prescindir?!
Pergunta Faber: "Não é
verdade que a alegria espiritual, o espírito de adoração, a simplicidade e o
gosto da vida oculta são assim grandes necessidades da vida cristã em geral e
especialmente eclesiástica? Pois estas graças brotam do culto do Santíssimo Sacramento
como as mais belas flores do altar.”
Interpretai o conceito do grande
teólogo; e compreendereis a sua extensão. Não é verdade que a tristeza, o zelo
amargo, o espírito do mundo, a vaidade e a dissipação são os maiores obstáculos
que temos de vencer se queremos corresponder à grandeza da nossa vocação?
Ora, com que Mestre poderemos
aprender melhor a alegria espiritual, a doçura, o discernimento da profanidade,
a humildade e o recolhimento do que com Jesus Cristo?
E onde Jesus Cristo nos aparece
mais no apogeu da doçura, da renunciação do mundo do abatimento e da vida
oculta do que no Santíssimo Sacramento?!
É impossível sairmos de diante
do Tabernáculo, onde vemos Jesus Cristo, por amor, reduzido a mais completa
pobreza; humilhado até a forma de um simples elemento, sem o desejo, quando
mais não seja, de sermos menos ambiciosos, mais mortificados, menos cheios de
vaidade e amor próprio?
O amor próprio, diz um mestre da
espiritualidade, é o opróbrio, a vergonha, o cativeiro, a minoria, o ar
corrompido da vida espiritual.
Ora, onde o nosso amor próprio
pode encontrar melhor, exemplo, de mortificação do que nesse abatimento, nessa
abjeção de Jesus Cristo Sacramentado?
Que magníficos insultos ao nosso
orgulho!
Que eloquentes exprobrações às
nossas suscetibilidades.
Que nítido espelho o Santíssimo
Sacramento para todos nós mirarmos bem as rugas do nosso rosto sacerdotal!
Quando mesmo não fosse dever
rigoroso do padre conviver o mais possível com o Santíssimo Sacramento; nunca o
padre deverá renunciar tão fecundo meio de santificação; ele deverá ter sempre
presente esta máxima de um santo: "o grande obstáculo ao progresso
espiritual é não fazermos senão o que é de preceito, ou o que não ofende a
Deus, abstendo-nos de tudo que podemos omitir sem pecado."
Que máxima! Quem na vida
espiritual vive indagando a exata medida de suas obrigações para só dar a Deus
aquilo que não Lhe pode recusar sem pecado está de fato bem inclinado a pecar.
Que fluido tão sutil e
facilmente evaporável a espiritualidade! Ninguém melhor o sabe do que o padre,
acostumado pela própria experiência vê-la tão fortemente combatida por tudo que
o cerca.
Inclinado por tantas influências
do mundo exterior a facilmente dissipar-se, é lhe preciso, compreende-se, um
ímã que a todo o instante a retenha e concentre. Todos os santos nos ensinam
onde podemos encontrar este ímã. A oração mental, a leitura ascética, a
mortificação do espírito ou do corpo são, sem dúvida, remédios para tão triste
enfermidade da vida espiritual; mas o específico, dizem os santos, - só o
tato, a convivência com Jesus Cristo, não na ação transitória dos seus outros
sacramentos, mas nesse que nos coloca face a face com Ele, no convívio da
amizade que consola, na intimidade do colóquio que instrui, no aconchego das
confidências que consola os pesares e esclarece as dúvidas.
Oh! o Santíssimo Sacramento é a
devoção imprescindível do padre. O cristão que o despreza é o viandante
imprudente que se lança nos atalhos sem o guia que conhece a estrada; mas o
padre que o despreza é o naufrago temerário que recusa a tábua no oceano onde
se debate contra as ondas e a tempestade!
Fonte: A Grande Guerra
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