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| Domenico Beccafumi, A Anunciação, (1545-1546) | 
Parece que não era necessário que fosse anunciado à Bem-aventurada Virgem o que iria realizar-se nela:
1. Com efeito, parece que a anunciação só
 seria necessária para obter o consentimento da virgem. Ora, tal 
consentimento não perece ter sido necessário, porque a concepção de uma 
virgem já estava anunciada de antemão pela profecia de predestinação que
 “se realiza sem a nossa decisão”, como diz uma Glosa. Logo, não era 
necessário que se realizasse tal anunciação.
2. Além disso, a bem-aventurada Virgem 
acreditava na encarnação, pois sem essa fé ninguém poderia estar em 
estado de salvação, porque, como diz a Carta aos Romanos: “A justiça de Deus é dada pela fé em Jesus Cristo”
 (3,22). Ora, quando alguém crê algo com certeza não precisa de 
ulteriores explicações. Logo, não era necessário à bem-aventurada Virgem
 que lhe fosse anunciada a encarnação do Filho.
3. Ademais, assim como a bem-aventurada 
Virgem concebeu a Cristo corporalmente, assim também toda alma santa o 
concebe espiritualmente; por isso diz o apóstolo na Carta aos Gálatas: “Meus filhinhos a quem de novo dou à luz, até que se forme Cristo em vós”
 (4, 19). Ora, aos que devem conceber Cristo espiritualmente não lhes é 
anunciada tal concepção. Logo não havia por que anunciar à 
bem-aventurada Virgem que iria conceber no seu seio o Filho de Deus.
EM SENTIDO CONTRÁRIO, o anjo, segundo o Evangelho de Lucas, lhe disse: “Eis que conceberás em teu seio e darás à luz um filho” (1, 31).
SOLUÇÃO. - Era conveniente que fosse anunciado à bem-aventurada Virgem que iria conceber Cristo:
1º. Para que fosse guardada a ordem que 
convinha à união do Filho de Deus com a Virgem, ou seja, que o seu 
espírito fosse preparado antes que ela o concebesse corporalmente. Por 
isso Agostinho diz: “Maria foi mais feliz de receber a fé em Cristo do que de conceber a carne de Cristo”. E acrescenta a seguir: “De
 nada teria servido a Maria a intimidade materna, se não tivesse sido 
mais feliz por levar a Cristo em seu coração do que em seu corpo”.
2º. Para que pudesse ser firme testemunha deste mistério, uma vez que fora instruída por Deus a respeito dele.
3º. Para que oferecesse a Deus os serviços voluntários da sua entrega, ao que prontamente se dispôs ao dizer: “Eis a escrava do Senhor” (Lc 1, 38).
4º. Para que assim se manifestasse 
existir um certo matrimônio espiritual entre o Filho de Deus e a 
natureza humana. Por isso, da anunciação se esperava o consentimento da 
Virgem em nome de toda a natureza humana*.
[* Nota: A idéia de que a encarnação é um
 “casamento” entre o Verbo de Deus e o gênero humano como um todo, que o
 corpo concebido em Maria traz em si toda a humanidade, é agostiniana. 
Mas é próprio de Sto. Tomás, e de importância capital, afirmar que tal 
“casamento” só se efetua, e para sempre, por meio de um “consentimento”,
 e que, tal consentimento, a Virgem Maria o deu em nome de todo o gênero
 humano: “per annuntiationem expectabatur consensus Virginis loco totius humanae naturae”. Que
 todo o gênero humano tenha como que se personalizado em Maria para 
tornar-se esposa de Deus que se faz homem, para tornar-se a Igreja, isso
 funda toda a teologia tão atual de Maria protótipo da Igreja, nova Eva,
 associada a Cristo em todo seu destino de Verbo encarnado. Isso permite
 compreender que a “mulher” do Gênesis (3, 15), ou a do capítulo 12 do 
Apocalipse seja ao mesmo tempo Maria e o gênero humano, do qual é a 
realização pessoal, para que ela dê à luz seu Salvador.]
Quanto às objeções iniciais, portanto, deve-se dizer que:
1. A profecia de predestinação se realiza sem que entre em ação o nosso livre-arbítrio, mas não sem o nosso consentimento.
2. A bem-aventurada Virgem tinha uma fé 
expressa na encarnação futura; mas, por ser humilde, não tinha tão alta 
idéia de si mesma. E por isso era preciso que fosse informada a respeito
 da encarnação.
3. A concepção espiritual de Cristo, que 
se realiza pela fé, é precedida por uma anunciação que é a pregação da 
fé, como diz a carta aos Romanos: “A fé vem pelo ouvido” (10, 17). Sem que, por isso, tenha alguém a certeza de possuir a graça, mas tem a certeza de que a fé que recebe é verdadeira.
(Suma Teológica, III part., quest. 3, art. 1) 

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