Quando no século XVI as
heresias de Lutero e Calvino conseguiram insinuar-se na Holanda, lá, como
na Alemanha e na Suíça, foram causadores de graves
distúrbios. Os calvinistas rebelaram-se contra o governo do rei
Filipe II e, chefiados pelo príncipe de Orange, tomaram à força
armada algumas cidades, entre estas a de Gorkum.O governador
retirou-se para o castelo em companhia de alguns católicos, dois párocos,
onde frades franciscanos e alguns sacerdotes seculares. Os calvinistas,
senhores que se fizeram da cidade, forçaram o castelo à
rendição. Esta se efetuou sob a condição, porém, de ser
garantido livre egresso a todos. Os calvinistas, desprezando
esta combinação, aprisionaram o comandante, todos os clérigos e
dois cidadãos, dos quais um foi enforcado imediatamente. Os sacerdotes
eram de preferência alvo do furor calvinista. Maus
tratos revezavam com ameaças de morte e finalmente foram
todos metidos num calabouço subterrâneo. No dia de
sexta-feira, lhes deram carne a comer. Querendo eles, porém, observar
a abstinência, tiveram de suportar toda a sorte de
sofrimentos e injúrias.
Ergueram em sua presença uma
força ameaçando-os com a morte, se não quisessem negar a
fé no Santíssimo Sacramento. Ao vigário, padre Nicolau
Van Poppel um dos bandidos pôs a arma na testa e berrou
aos ouvidos: “Anda, padre! Como é? Tantas vezes
declaraste no púlpito que estavas pronto a dar a vida pela
fé. Pois então, dize! Estás mesmo disposto?” O
padre respondeu: “Dou a minha vida com muito prazer, se é em
testemunho da minha fé e principalmente do artigo por
vós rejeitado, o da presença real de Jesus
no Santíssimo Sacramento”. Perguntado pelos tesouros, que
supunham estarem escondidos no castelo, padre Nicolau não soube dar
informações a respeito. O calvinista lançou-lhe então uma corda ao
pescoço, puxou-o de um lado para o outro, até que caiu como
morto.
Chegara vez dos franciscanos. Ao frei Nicásio Pick puseram o mesmo cordão
ao pescoço, arrastaram-no à porta do cárcere. Lá chegando, meteram
a corda por cima da porta e puxando com força, suspenderam a
vítima a altura considerável, para imediatamente deixarem
cair. Isto praticaram com diabólico prazer. Afinal
a corda rebentou e o pobre padre caiu pesadamente ao chão,
sem mais dar sinal de vida. Para verificar se estava
vivo ou morto, os soldados trouxeram velas, queimaram-lhe a testa, o
nariz, as pálpebras, as orelhas, a boca e finalmente a língua. Como
o padre não desse mais sinal de vida, deram-lhe pontapés e disseram
com ar de desprezo: ” É um frade, que importa?” Mas o
padre não estava morto, tanto que no dia seguinte os bandidos tiveram sua
satisfação de poder continuar as crueldades.Durante toda a noite os
padres estiveram entregues à sanha daqueles demônios em
figura humana. Não havia nada que abrandasse o furor
dos endiabrados hereges. Davam bofetadas nos
religiosos, com tanta força e brutalidade, que lhes corria o sangue pelo
nariz e pela boca. O padre Willehad, um venerável ancião de
noventa anos, repetia a cada bofetada que recebia, a
jaculatória: “Deus seja louvado!” Os algozes, sentindo-se fatigados
de tanto bater, ajoelhavam-se diante dos padres e entre risos
de escárnio, arremedavam a confissão, proferindo nesta ocasião obscenidades
e blasfêmias horríveis e asquerosas. Em outra
ocasião, amarraram os religiosos dois a dois
e obrigaram-nos a andarem em fila, imitando a procissão e
a cantar o “Te Deum” e tudo isto sob a algazarra
satânica da soldadesca desenfreada. Depois puseram dados nas mãos
das vítimas para assim. à guisa do jogo, tirar
a sorte quem deles primeiro havia de subir à
forca. O padre Guardião exclamou: “Não se faz mister de jogo,
estou pronto, porque já passei por esta delícia” Os católicos de Gorkum
envidaram todos os esforços para libertar os prisioneiros. Para este fim,
dirigiram uma petição ao príncipe de Orange. Os
calvinistas suspeitando qualquer reação, tiraram aos
franciscanos o hábito e despacharam-nos, com outros
sacerdotes, na noite de 5 a 6 de julho, para Briel, à residência do
clerofobo conde Lumam von Marc. A pena se nega a
fazer a descrição de tudo que aqueles religiosos tiveram de sofrer,
dos verdugos e do populacho fanático. Em Dordrecht
estava à espera um navio, que devia levá-los até Briel. Antes
do embarque, um bando de calvinistas arrastou os mártires a um lugar
perto do rio, onde estava aparelhada uma forca. Como
cães raivosos, atiraram-se sobre as pobres vítimas e o ar
encheu-se de insultos e vitupérios como estes: “Eis aí a
vossa Igreja! Ide, rezai a vossa Missa”. Em seguida, obrigaram-nos
a passarem três vezes em volta da força, sendo a última vez
com os joelhos no chão, sob o canto da “Salve Rainha”. Enquanto os
religiosos se puseram a obedecer esta ordem ridícula e
estapafúrdia, choviam-lhes bengaladas e pedradas às
costas. O padre vigário Jerônimo de Weert, vendo estas
indignidades, não mais se conteve e disse: “Que estou presenciando?
Estive entre turcos e infiéis, mas coisa igual a esta eu
nunca vi!” Finalmente o triste cortejo chegou a Briel. Lá o esperava o
conde Lumm, com dois pregadores da seita e alguns
magistrados. Todos se empenharam para conseguir
dos prisioneiros a renúncia à fé, em particular ao
dogma da real presença de Jesus Cristo no Santíssimo Sacramento. Foram
baldados os esforços. Os mártires unanimemente rejeitaram as
propostas feitas e preferiram continuar na prisão. O
cárcere que os recebeu, era uma pocilga imundíssima. Uma ordem do
príncipe de Orange, de por em liberdade os prisioneiros, não foi cumprida.
O conde Lumm, embriagado de ódio e vinho, mandou-os levar,
alta noite, às ruínas do convento Rugem, que pouco antes tinha sido
incendiado pelos calvinistas. Restara ainda o celeiro. O
padre Guardião foi lá mesmo enforcado, depois de ter animado os irmãos
à constância. Depois deles, foram estrangulados todos os
companheiros. O fanatismo dos calvinistas nem respeitou os cadáveres dos
mártires. Cortaram-lhes o nariz, as orelhas e levaram-nos como troféus
de vitória nos capacetes e chapéus. Os católicos resgataram por muito
dinheiro os corpos dos santos irmãos e transportaram-nos para
Bruxelas. Clemente X beatificou-os em 1674 e Pio
IX elevou-os à categoria de Santos, no ano de
1867.
Eis os nomes dos
gloriosos mártires de Gorkum:
Onze deles eram franciscanos:
Nicolau Pieck, Jerônimo de Werder, Thierry de Embden, Nicário Jonhson, Wilhade
de Dinamarca, Godofredo de Merveille, Antônio de Werden, Antônio de Harnário,
Francisco Rodes de Bruxelas, Pedro de Asca no Brabante e Cornélio de
Dorestante, no território de Ultrecht. Um dominicano, João de Colônia dois
nobertinos ou premonstratenses, Adriano Janszen e Tiago Lacops João Lenartsz,
que era cônego regular de Santo Agostinho e quatro padres seculares.
Foram
beatificados em 1675 e canonizados em 1867.
Santos Mártires de Gorkum, rogai por nós.
Fonte: Escravas de Maria
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