(Corpo incorrupto de São Vicente de Paula) |
Pretiosa
in conspectu Domini mors sanctorum eius – “Preciosa é aos olhos do Senhor a morte de seus
Santos” (Ps. 115, 5).
Sumário. A morte assusta os pecadores,
que sabem que da primeira morte, do estado de pecado, passarão à segunda, que é
eterna. A morte é, porém, o consolo das almas boas, que, confiadas nos
merecimentos de Jesus Cristo, tem indícios suficientes para estarem moralmente
certas de se achar na graça de Deus. Para estas a morte é preciosa, porque é um
repouso suave depois das angústias padecidas no combate contra as tentações, ou
em aplacar os temores e os escrúpulos de desagradar ao Senhor. Oh, que consolo
poder dizer: Nunca mais ofenderei ao meu Deus!
I. A
morte assusta os pecadores, que sabem que da primeira morte, do estado de
pecado, passarão à segunda, que é eterna. Não amedronta, porém, as almas boas,
que, confiadas nos méritos de Jesus Cristo, têm suficientes indícios para terem
certeza moral de que se acham na graça de Deus. – Por isso aquele Proficiscere:
Parte, ó alma, deste mundo, que tanto perturba os que morrem contra a sua
vontade, não perturba os santos, que desprenderam o coração de todo o amor
terrestre e com todas as veras sempre disseram: Deus meus et omnia – “Meu
Deus e meu tudo”.
Para
estes a morte não é um tormento, mas o repouso depois das angústias padecidas
no combate contra as tentações e das inquietações causadas pelos escrúpulos e
temores de ofender a Deus. Neles se realiza o que escreve São João: Beati
mortui qui in Domino moriuntur! Amodo iam dicit Spiritus: ut requiescant a
laboribus suis (1) – “Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor!
Desde agora diz o Espírito que descansem de seus trabalhos”. – Quem morre
no amor de Deus, não se perturba pelas dores que acompanham a morte; muito ao
contrário, nelas se compraz, oferecendo-as a Deus como os últimos restos da sua
vida. Oh! Que paz tão profunda goza o que morre resignado, abraçado com Jesus
Cristo, que escolheu para si uma morte amargosa e desolada, a fim de nos obter
uma morte suave e resignada!
Ó meu
Jesus, Vós sois meu Juiz, mas sois também meu Redentor, que morreu para me
salvar. Não era mais digno de Vos amar, mas, pelos vossos benefícios, me
atraístes a vosso amor. Se é vossa vontade que eu morra desta doença, de boa
mente aceito a morte. Sei que não mereço entrar logo no céu; contente estou de
ir ao purgatório para ali padecer quanto Vos agrada. A minha pena mais grave
será ver-me longe de Vós, suspirando por ir ver-Vos e amar-vos face a face.
Portanto, meu amado Salvador, tende piedade de mim.
II. Não
se pode viver nesta vida sem culpas. Eis o motivo porque as almas amantes de
Deus desejam a morte. Este pensamento enchia o Padre Vicente Carafa de
consolação na hora da morte; ele disse: “Visto que acabo de viver, acabo de
ofender ao meu Deus”. Certa pessoa mandou, aos que a assistiam, que na hora da
morte lhe repetissem muitas vezes estas palavras: Consola-te, visto ter
chegado o tempo em que não poderás mais ofender a teu Senhor.
Com
efeito, o que é para nós nosso corpo senão uma prisão, na qual a alma está
encarcerada sem poder unir-se a seu Deus? Pelo que o amante São Francisco
exclamou na hora da morte, com o Profeta: Educ de custodia animam meam
(2) – Senhor, livrai-me a alma deste cárcere que a impede de Vos contemplar. –
São Pionio Mártir, quando já estava ao pé do patíbulo, mostrou-se tão alegre,
que as pessoas presentes, admiradas de tão grande alegria, lhe perguntaram,
como é que podia estar tão radiante de alegria, estando tão próximo da morte.
“Estais enganados”, respondeu o Santo, “eu não vou à morte, mas à vida que me
fará viver eternamente.”
Meu
dulcíssimo Jesus, graças Vos dou por não me terdes deixado morrer quando estava
em vossa desgraça e por Vos haverdes conquistado meu coração pela grande
bondade que tivestes para comigo. Quando penso nos desgostos que Vos causei,
quereria morrer de dor. Em vossas mãos deposito a minha alma que já estava
perdida. Lembrai-Vos, Senhor, de que a resgatastes com o preço de vossa morte: Redemisti
me, Domine, Deus veritatis (3). – Amo-Vos, ó bondade infinita, e desejo
sair já deste mundo para Vos ir amar com amor mais perfeito no céu. Mas,
enquanto ficar ainda nesta terra, fazei-me sempre conhecer melhor a obrigação
que tenho de Vos amar. Meu Deus, dignai-Vos aceitar-me: sou todo vosso, a Vós
me consagro e em Vós confio pelos merecimentos de Jesus Cristo. – Ó Maria,
minha esperança, confio também na vossa intercessão. (*II 310.)
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1. Apoc. 14, 13.
2. Ps. 141, 8.
3. Ps. 30, 6.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do
Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de
Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia,
1921, p. 290-293.)
Fonte: São Pio V
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