Fr.
Manuel Sancho,
Exercícios
Espirituais para Crianças
1955
PARTE
PRIMEIRA
A
conversão da vida do pecado à vida da graça
(Vida
Purgativa. — 1.ª semana)
4.
— Que é, além disto, a morte? É a separação da alma e do corpo. Com a morte,
não só deixamos as coisas e pessoas que mais amamos, como também a alma deixa o
corpo, companhia tão antiga e tão cara; e, ao se separarem, os dois tremem de
angústia, o corpo porque vai converter-se em cadáver que os vermes comerão; a
alma, porque do outro lado da morte a espera Jesus Cristo para julgá-la e lhe
dar um céu para sempre, se ela é boa, ou um inferno, se é má. Terrível
alternativa! Terrível pavor o da alma nesse transe! — Que será de mim? — dirá
então o menino díscolo e desobediente. — Como comparecerei perante Jesus
Cristo, que me espera para me julgar? — Então aparecer-lhe-ão ao vivo todos os
pecados, todas as impurezas, todas as maldades e desobediências... Então vos
lembrareis destas exortações que vos dirijo, e direis: “Oxalá as houvéssemos
aproveitado! Oxalá tivéssemos feito naqueles exercícios uma boa confissão!
Oxalá tivéssemos comungado com frequência e fugido do pecado e das más
companhias como da peste! — Pois agora, meus filhos, é a ocasião, agora é o
tempo de vos converterdes a Deus, de fazerdes uma boa confissão, tirando por
ela os pecados que vos impedem a consecução do vosso fim último, que é a
fruição de Deus.
5.
— Para compreenderdes o que se padecerá naquela ocasião, reparai no que se
passa na alma de um preso que no seu calabouço está esperar do de um momento
para outro a condenação à morte ou a absolvição do crime. Ele sabe que os
juízes estão deliberando, sabe que dentro em um momento vão dizer-lhe:
“Condenaram-te à morte”, ou: “Sai livre do calabouço”. Que angústias! Que
pavores padecerá o desditoso! Algo semelhante acontece ao moribundo que sabe
que pecou e teme não haver feito verdadeiros frutos de penitência.
Mas
o verdadeiramente terrível é quando alguém vê a morte aproximar-se desesperado.
Assim morreu Judas. Via a sua vida passada junto a Jesus Cristo como um sonho;
depois os seus pecados, a sua avareza, o vender Jesus... Depois, como, por essa
traição sua, condenavam Jesus. Ai! ele mesmo o havia entregado! A desesperação
de se salvar enrolava-se-lhe à alma qual serpente infernal, e ele se enforcou,
e desceu para sempre ao inferno. Que morte horrível! Assim morreu também
Antíoco. Este foi um rei cruel e perverso. Violou o templo de Jerusalém
“tomando com suas mãos sacrílegas os vasos sagrados” (2 Mac 5, 16), matou muita
gente, perseguiu a religião. Deus teve paciência, mas um dia chegou o fim para
aquele rei ímpio. Vencido por Judas Macabeu, expulso com ignomínia de
Persépolis, ergueu a sua fronte orgulhosa jurando vingar-se de Jerusalém. “Mas
o Senhor Deus de Israel, que vê todas as coisas, feriu-o com uma chaga interior
e incurável... O corpo daquele ímpio pululava de vermes, e, ainda em vida, as
carnes se lhe desprendiam no meio das dores, de modo que era intolerável... o
fétido que dele se desprendia” (cap. IX). Em vão fez ele promessas, em vão
“rogava ao Senhor de quem não havia de alcançar misericórdia”, e no meio de
dores atrozes morreu “este homicida e blasfemo... Acabou a sua vida nos montes
com uma morte infeliz”.
Vós
estais bem longe de ser homens tão malvados, pois temeis o pecado mortal, que
pode conduzir-vos a uma morte eterna; mesmo os pecados veniais vós os temeis,
porque levam ao pecado mortal. Procurai viver em graça de Deus e fugir até
mesmo do pecado venial, longe de dúvidas e de pavores. Vivei assim, para não
morrerdes intranquilos. Que haveis de fazer para vos livrardes desses pavores
naquela hora? Uma coisa muito simples: vos confessardes bem durante estes
Exercícios, começando a viver santamente, e, na hora de morrerdes, a morte vos
encontrará alegres e tranquilos, como encontrou a menina santinha de que vos
falei.
6.
— Considerai agora as propriedades da morte. A morte é certa. Se sobre isto
pudésseis dizer: “Pode ser que não seja verdade”, ainda receberíeis alguma
esperança de não morrer. Mas é vã esta esperança, porque todos, todos os homens
hão de morrer. Velhos ou crianças, ricos e pobres... todos morreremos. Este de
desgraça, aquele de doença, todos havemos de morrer. Cada um de vós, reparai
bem, cada um há de morrer, há de ser enterrado, seu corpo há de virar vermes, e
sua alma há de salvar-se ou condenar-se conforme tenha vivido.
Além
de certa, a morte é inesperada. Virá quando menos o pensarmos. E isto não sou
eu que invento, foi Jesus Cristo quem o disse com estas palavras: “Ela virá
surpreender-vos como o ladrão”, que entra para roubar quando ninguém o espera
nem o teme. Assim Jesus Cristo virá julgar cada um de vós ao morrerdes, quando
mais descuidados estiverdes.
Pedro
está brincando, sem pensar na morte. De repente sente-se mal. Deitam-no. —
Chamem o médico, o padre... porque ele está morrendo... porque está morrendo;
já morreu. — O padre não chega a tempo, embora o tenham chamado à pressa. Reza,
benze-o... Chega o médico. Examina. Será esta doença? Será aquela outra? Para
que examinar? Seja lá que doença for, Pedro já está morto. Assim morrem muitos.
Outros vão morrendo aos poucos, como uma luz que se apaga.
Oh!
se soubéssemos o dia certo da nossa morte, poderíamos preparar-nos para aquela
hora. Mas também viveríamos mais descuidados. Para que estivéssemos sempre
preparados para morrer, Jesus Cristo quis que tivéssemos esta incerteza do dia
e da hora da nossa morte.
Enfim,
a morte vem uma vez só. Se tivéssemos duas mortes e fizéssemos mal a primeira,
poderíamos sanar o grande erro e viver bem, esperando tranquilos a segunda
morte, definitiva; porém morreremos só uma vez.
Na
verdade, se calmamente considerardes que certamente haveis de morrer quando
menos o pensardes, que haveis de morrer uma vez só, procurareis estar sempre
preparados para aquele transe. E me perguntareis: Mas, Padre, como é que
estaremos sempre preparados para a morte? Levando uma boa vida, não pecando, e,
se pecardes, confessando-vos quanto antes. Jamais durmais em pecado mortal,
porque podeis morrer nesse estado e condenar-vos. Confessai-vos quanto antes se
puderdes, e, se não puderdes, fazei um ato de contrição sincera. Em resumo:
vivei bem, se quiserdes morrer bem.
Que
devemos fazer para nos livrarmos de incertezas naquela hora? Uma coisa muito
simples: confessar-vos bem nestes Exercícios, começando desde já a viver
santamente, e, na hora de morrerdes, a morte vos encontrará alegres e
tranquilos, como encontrou a menina santinha de que vos falei.
7.
— Por ocasião da morte, a alma deixa o corpo e comparece diante de Jesus
Cristo. Se, por desgraça, está em pecado mortal, dir-lhe-á o Juiz dos vivos e
dos mortos: “Vai-te, maldita, para o fogo eterno: porque tive fome e não me
deste de comer; tive sede e não me deste de beber” (Mt 25, 42). Dirá então a
coitada: — Mas, Senhor, quando foi que não te dei de comer nem te dei de beber?
— Quando não fizeste caridade ao pobre; quando escandalizaste, quando cometeste
infâmias; quando faltaste gravemente aos meus preceitos. Vai-te, pois, maldita,
para o inferno, para sempre”. E se abrirá um boqueirão fundíssimo, e, entre
chamas e fumo, a alma réproba descerá aos infernos. Meu Deus, que horror. Assim
termina a vida daquele que peca. Assim termina o menino vicioso, a menina má.
Não, meus filhos, vós não sereis assim; confessar-vos-eis, fareis bem os
Exercícios e terminareis desta outra maneira:
Quando
a alma da criança boa comparecer, depois da morte, perante Cristo, tendo
comungado bem, estando bem preparada, bem corrigida das suas más paixões e rica
de virtudes, levando-a pela mão a Virgem Maria, Cristo lhe dirá: “Vem, filha,
vem gozar comigo por toda a eternidade”. E em estreito abraço levá-la-á ao céu.
É
mui provável que Jesus ainda encontre nela algumas manchas ou restos de culpas
passadas, ainda não bem purgadas e limpas, e, como no céu não pode entrar nada
manchado, dir-lhe-á Ele então: "Aguarda um pouquinho, pois é preciso te
limpares dessas postemas que trazes da terra”, e lançá-la-á no purgatório para
que se queime por uma temporada e lhe caiam aquelas crostas más. No purgatório
ela padecerá dores extremas, sentirá em seus membros os mais vivos martírios,
como se estivesse no inferno, mas com a diferença de que no inferno jamais
terão fim os tormentos e estarão unidos a um desespero espantoso. Ademais, no
purgatório, a paciência que Deus infundirá na pobre alma, a esperança de que
aquilo há de terminar, farão com que a alma sofra com resignação. Por outro
lado, as orações e boas obras e missas que nós os que vivemos neste mundo
aplicamos às almas do purgatório, fazem que os seus tormentos se acabem mais
cedo e elas vão depressa fruir da glória.
Para
que sejais bem sucedidos no juízo particular, procurai agora ter propícia a vós
a Virgem Maria. Oh! quanto vos valerá então a sua devoção! Quando uma criança
se vê em perigo, chama logo por sua mãe; e sua mãe a ajuda e a salva. Isto
mesmo fará então a Virgem Maria com os que lhe tenham sido devotos. Amai-a
desde agora; invocai-a pedindo-Lhe uma boa morte, convertendo-vos desde agora a
uma boa vida, e, para isto, rezai comigo três Ave-Marias.
Continuará
com o capítulo: O Inferno!
Fonte: A Grande Guerra
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