Quos
praescivit, et praedestinavit conformes fieri imaginis Filii sui – “Os que conheceu na sua
presciência, também predestinou para se fazerem conformes à imagem de seu
Filho” (Rom. 8, 29).
Sumário. Compenetremo-nos bem de que os
religiosos, contanto que guardem suas Regras, são os homens mais felizes do
mundo; porque mais do que os outros são imitadores da vida de Jesus Cristo. Os
mundanos têm-nos por loucos, mas no vale de Josafá conhecerão terem sido eles
os loucos, porque deixaram o caminho da verdade e assim condenaram-se para
sempre. Demos graças ao Senhor pela escolha que fez de nós e sejamos fiéis à
nossa vocação. Ai de nós, se tivéssemos a desgraça de a perder.
I. O
Apóstolo diz que o Pai Eterno predestina ao reino dos céus só àqueles que têm
uma vida conforme a do Verbo Incarnado: Os que conheceu na sua presciência,
também predestinou para se fazerem conformes à imagem de seu Filho. Quanto
devem, pois, estar contentes e certos do céu os religiosos, vendo que Deus os
chamou a um estado de vida que entre todos é o mais conforme à vida de Jesus
Cristo!
Jesus
nesta terra quis viver pobre como simples aprendiz de operário, numa casa
pobre, com vestidos pobres, com alimentos pobres: Propter vos egenus factus
est, cum esset dives (1) – “Apesar de ser rico, ele se fez pobre por vós”.
Demais, ele escolheu para si uma vida toda mortificada, apartada de todos os
prazeres do mundo e sempre acompanhada de penas e tristezas, do nascimento até
à morte, pelo que foi chamado pelos profetas o homem das dores: vir dolorum
(2). Com isso fez ver a seus servos, qual deve ser a vida de quem o quer
seguir, isto é, uma vida de abnegação e de sacrifício: Si quis vult venire
post me, abneget semetipsum, tollat crucem suam, et sequatur me (3) – “Se
alguém quiser vir atrás de mim, renuncie a si próprio, tome a sua cruz, e
siga-me”.
Seguindo
este exemplo e este convite de Jesus, os santos procuravam despojar-se de todos
os bens terrenos e carregar-se de penas e de cruzes para assim seguirem seu
amado Senhor. – Assim fez um São Bento, que, sendo filho dos senhores de Núrcia
e parente do imperador Justiniano, renunciou às delícias e riquezas do mundo,
e, jovem de 14 anos, foi viver numa gruta no monte Sublaco. Assim fez um São
Francisco de Assis, que, entregando ao pai toda a porção da herança que lhe
competia, até o próprio vestido, pobre e mortificado se consagrou todo a Jesus
Cristo. Assim um São Francisco de Borgia, um São Luiz Gonzaga, que sendo, o
primeiro duque de Gandia e o segundo príncipe de Castiglione, deixaram
riquezas, vassalos, pátria, casa e parentes, e foram viver pobres num convento.
E assim fizeram outros muito nobres e príncipes, mesmo de sangue real. Só na
ordem beneditina se contam setenta e cinco imperadores, reis e rainhas que
deixaram o mundo para viverem pobres, mortificados e esquecidos do mundo, em um
pobre convento, e assim se tornarem mais semelhantes a Jesus Cristo.
II.
Compenetremo-nos bem de que os religiosos, contanto que guardem as suas Regras,
que os religiosos, e não os grandes do mundo, são os verdadeiros felizes,
porque, mais do que quaisquer outros, são imitadores de Deus, como filhos
prediletos (4). Os mundanos os têm por loucos, mas no vale de Josafá
conhecerão terem sido eles os loucos. Vendo então os Santos em seus tronos,
coroados por Deus, chorando e desesperados dirão: “São estes de quem nós algum
tempo escarnecíamos. Nós, insensatos! Tínhamos a vida deles como uma loucura...
Eis como são contados no número dos filhos de Deus e a sua sorte é entre os
santos. De que nos aproveitou nosso orgulho? (5)
Meu
Mestre e Redentor Jesus, eis-me, portanto, no meio dos ditosos, que Vós
chamastes para Vos seguirem. Senhor meu, graças Vos dou! Deixo tudo: desejaria
ter mais que deixar para Vos seguir, meu Rei e meu Deus, que escolhestes para
Vós uma vida tão pobre e tão cheia de privações por amor de mim e para me dar
ânimo com o vosso exemplo. Caminhai adiante, Senhor, que eu Vos seguirei.
Escolhei para mim a cruz que quiserdes e ajudai-me porque quero levá-la com
constância e amor. – Pesa-me que no passado Vos abandonei para correr atrás de
minhas satisfações e das vaidades do mundo; agora não quero mais abandonar-Vos.
Prendei-me à vossa Cruz; e se, pela minha fraqueza, eu resistir alguma vez,
atrai-me com as doces cadeias do vosso amor e não permitais que eu Vos deixe
ainda.
Sim, meu
Jesus, renuncio a todos os prazeres do mundo; o meu único prazer será
seguir-Vos, amando e sofrendo tudo que for do vosso agrado. Assim espero
achar-me um dia em vosso reino, ligado a Vós com o laço do amor eterno, com
que, amando-Vos sem véu, não poderei mais temer ver-me solto e separado de Vós.
Amo-Vos, meu Deus e meu tudo, e sempre Vos amarei. – Maria Santíssima, vós que,
por terdes sido a mais semelhante a Jesus, sois agora a mais poderosa para
alcançar aas graças, protegei-me. (*IV 428.)
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1. 2 Cor. 8, 9.
2. Is. 53, 3.
3. Matth. 16, 24.
4. Eph. 5, 1.
5. Sap. 5, 3.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do
Ano: Tomo Segundo: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de
Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia,
1921, p. 275-277.)
Fonte: São Pio V
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