CONSELHOS SOBRE A VOCAÇÃO
CAPÍTULO III
COMO CORRESPONDER À VOCAÇÃO
Padre J. Guibert
(Superior do Seminário do
Instituto Católico de Paris)
edição de 1937
65. — Estareis com a alma em
paz, jovem amigo, depois de receber o aviso de vosso diretor. A palavra dele,
que vossa fé há de considerar como a própria palavra de Deus, acabará com toda
a indecisão e vos fixará as idéias. Se ele vos dissesse: «Meu menino, procurai
uma carreira no mundo, porque o estado religioso está acima de vossas forças;»
não deveríeis hesitar um só instante em sacrificar vossas primeiras esperanças.
Mas se ele vos respondeu: Tenho fé que Deus vos chama, meu menino: preparai-vos
para segui-lO;» não hesiteis tão pouco e considerai esta decisão como um
oráculo do céu. Então não tendes mais dúvida alguma; sereis sacerdote ou
religioso; estais vendo o caminho que Deus vos abre. Novas obrigações vos
aguardam agora. Uma vez conhecida a vocação devemos nos tornar dignos dela;
quando se sabe claramente o desejo de Deus, é preciso corresponder a ele;
quando o caminho está traçado, é preciso andar por ele. Tudo isso se chama
corresponder à vocação.
Para corresponder à vossa
vocação tendes três coisas a fazer: separar-vos, formar-vos, conservar-vos. É o
que devo ainda explicar-vos com alguns pormenores.
I. A SEPARAÇÃO
66. — Pois que Deus vos
escolheu e vos marcou com o sinal da vocação, é justo que lhe pertençais. Para
lhe pertencer é necessário romper todos os vínculos: vínculos do pecado em
primeiro lugar, depois os vínculos do mundo, enfim os vínculos da própria
família.
1.º Renunciar ao pecado.
67. — O grande inimigo de Deus
é o pecado. O pecado grave, com efeito, expulsa Deus da alma para se apoderar
dela. Que injúria seria para Deus, se, depois de resolver dar-vos a ele na
religião, deixásseis ainda o pecado dominar em vós! Por isso é que vosso
primeiro dever é combater energicamente para defender vossa alma contra os
assaltos do demônio.
Talvez, até agora, tenhais
conservado a inocência batismal. Como teríeis a ousadia de perdê-la, no momento
em que desejais dedicar a Deus vossa alma como um templo sagrado?
Mas pode ser que tenhais
perdido a primeira inocência. Surpreendido pelas primeiras perturbações da
adolescência, arrastado pelos exemplos de companheiros perversos, pecastes. É
uma desgraça muito grande, da qual as almas religiosas nunca se consolam. Mas,
graças a Deus, as devastações do pecado não são irreparáveis: no sacramento de
Penitência, as lágrimas de vosso arrependimento, misturadas com o sangue de
Jesus Cristo, apagaram todas as nódoas e vos restituíram a vida. A inocência
foi recuperada.
Conservada ou recuperada, dora
em diante esta inocência deve permanecer intacta em vosso coração. Estais com
firme vontade de não pecar mais. Mas a vontade não basta: é preciso tomar os
meios.
68. — Com efeito, rudes
assaltos hão de fazer-se contra vossa virtude: vossa inocência será o prêmio de
vossos combates. Inimigos terríveis hão de nascer dentro de vós mesmo e
persuadir-vos de vos deixar escorregar no abismo dos maus prazeres. Se cederdes
um pouquinho diante das primeiras tentações, se quiserdes provar, por pouco que
seja, a taça envenenada, em breve tereis a morte espiritual: portanto é preciso
resistir logo, desde as primeiras instigações do mal.
A estas inclinações da natureza
sensual, unir-se-ão os atrativos exteriores: o mundo esforçar-se-á por seduzir-vos
por meio de suas falsas máximas e seus prazeres enganadores; o exemplo de
companheiros corruptos vos deixará acreditar, em certos momentos, que o mal
talvez não seja o mal, que a virtude talvez não esteja ao alcance do homem;
certa vergonha mal entendida de que sejais o único menino recatado e puro no
meio de uma sociedade pervertida, talvez vos enfraqueça a coragem. Oh! como é
difícil manter-se firme no bem, quando tantas correntes arrastam para o
mal!Para vencer, nesta guerra encarniçada, três coisas são necessárias: o
auxílio de um bom diretor, orações fervorosas, esforços de vontade.
69. — Um diretor prudente vos
indicará o que é mau, mostrar-vos-á onde está o perigo, prevenir-vos-á contra
as surpresas. Revelar-lhe-eis o fundo de vosso coração, vossas perturbações,
desânimos, se houver. Na luta, é ele que vos indicará a tática e o modo de
manejar as armas. Nada lhe escondais: a menor dissimulação tornar-se-ia para
vós uma causa de ruína moral. Se ele parecer severo, não vos espanteis: porque sua
severidade se dirige toda contra o pecado e não contra vós; para vossa alma,
possui apenas ternura e dedicação.
A oração há de atrair-vos a
graça de Deus. Rezar é absolutamente necessário; porque não triunfareis senão
pela graça; e a graça, na sua plenitude, não é dada senão à alma que reza. Sede
um menino piedoso e nunca haveis de pecar. Recomendo-vos, de modo especial, a
santíssima comunhão, a devoção a Nossa Senhora: o divino corpo de Jesus Cristo
purifica e fortifica as almas; Nossa Senhora mostrou-Se sempre a protetora dos
corações puros.
Contudo, para alguém que é mole
e inativo, os socorros mais poderosos de nada servem. Apesar de tudo,
permaneceis livre de ser bom ou mau. Deus vos entrega várias armas que vosso
diretor espiritual vos ensina a manejar. Mas se vossos braços, preguiçosos e
sem vigor, não tiverem a coragem de mover-se, sereis um vencido, não há a menor
dúvida. O esforço que se exige de vossa parte, é que fujais das sociedades
perigosas, nunca permaneçais desocupado, eviteis as leituras suspeitas, nunca
fiqueis complacente e impassível diante da tentação e peçais o auxílio de Deus
cada vez que o demônio vos ataca.
Todavia, se viésseis a
sucumbir, oh! não hesiteis em recorrer a vosso confessor. Deus é bom pai e
pastor condescende. Entende que uma ovelha erre o caminho e receba ferimentos;
logo corre-lhe atrás e apresenta-lhe os braços e não quer que ela fuja diante
de Suas misericordiosas carícias. Quem não gostará muito desta bela palavra de
S. João, o apóstolo que Jesus amava particularmente: «Meus filhinhos,
escrevo-vos isto para que não pequeis; mas se por acaso pecardes, não vos
esqueçais de que temos perante o Pai um advogado omnipotente, Jesus o Santo!»
2.º Separar-vos do mundo.
Fonte: A Grande Guerra
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