(A Adoração dos Magos, Bartolomé Esteban) |
Parece que não foi
conveniente que os magos viessem adorar e venerar a Cristo:
1. Com efeito, cada rei deve receber a homenagem
de seus súditos. Ora, os magos não pertenciam ao reino dos judeus. Logo, quando
conheceram pela visão da estrela que tinha nascido o Rei dos Judeus, parece que não era
conveniente que viessem adorá-lo.
2. Além disso, é imprudente anunciar um rei
estrangeiro enquanto vive o próprio rei. Ora, Herodes reinava no reino dos
judeus. Logo, os magos procederam com imprudência ao anunciar o nascimento do
rei.
3. Ademais, um sinal do céu é mais seguro do que
uma indicação humana. Ora, os magos vieram do Oriente à Judéia guiados por um
sinal do céu. Logo, agiram sem prudência ao buscar uma indicação humana,
abandonando a guia da estrela, quando perguntaram: “Onde está o rei dos judeus
que acaba de nascer?”.
4. Ademais, a oferenda de dons e a homenagem da
adoração são devidas só aos reis que estão reinando. Ora, os magos não encontraram
Cristo revestido da dignidade real. Logo, não foi conveniente apresentar-lhe
dons e render-lhe homenagem real.
EM
SENTIDO CONTRÁRIO,
afirma Isaías: “As nações vão caminhar para a
tua luz e os reis para a claridade da tua aurora” (60, 3). Ora, os
que são conduzidos pela luz divina não erram. Logo, os magos não incorreram em
erro ao prestar homenagem a Cristo.
Como já foi dito, os magos são as primícias dos pagãos a crerem em
Cristo. Neles apareceram, numa espécie de presságio, a fé e a devoção dos
pagãos vindos a Cristo de lugares remotos. Por isso, sendo a fé e a devoção dos
pagãos isenta de erro por inspiração do Espírito Santo, também deve-se crer que
os magos, inspirados pelo Espírito Santo, se comportaram sabiamente ao
prestarem homenagem a Cristo.
Quanto às objeções iniciais, portanto, deve-se
dizer que:
1. Como diz Agostinho: “Muitos reis dos judeus
nasceram e morreram sem que os magos os tivessem procurado para adorá-los. Não
é, pois a um rei dos judeus como então costumavam ser, que estes estrangeiros,
vindos de tão longe, e totalmente alheios a este reino, julgavam estar
prestando tão grande homenagem. Mas aprenderam que o
recém-nascido era tal que não podiam duvidar que, adorando-o, conseguiriam a
salvação que é segundo Deus”.
2. O anúncio aos magos prefigurava a constância
dos pagãos em confessar Cristo até a morte. Por isso diz Crisóstomo: “Tendo os
olhos postos no rei futuro não tinham medo do rei presente. Ainda não tinham
visto Cristo e já estavam preparados para morrer por ele”.
3. Como Agostinho diz: “A estrela que conduziu os
magos ao lugar em que o Deus-menino se encontrava com sua mãe virgem podia
conduzi-los à cidade de Belém, na qual Cristo nascera. Escondeu-se, contudo,
até que os judeus dessem testemunho da cidade na qual Cristo deveria nascer”.
Assim também, “confirmados com este duplo testemunho, como diz o papa Leão,
buscassem com fé mais ardente aquele que era manifestado pela claridade da
estrela e pela autoridade da profecia”. Segundo Agostinho: “Eles mesmos anunciam
o nascimento de Cristo e perguntam pelo lugar, creem e buscam, como para
significar os que caminham na fé, e desejam a visão”. Mas os judeus, que lhes
indicaram o lugar do nascimento de Cristo, são semelhantes àqueles carpinteiros
que construíram a arca de Noé: forneceram a outros os meios para escapar, mas
eles mesmos pereceram no dilúvio. Os que procuravam, ouviram e partiram; os
doutores falaram e ficaram, semelhantes às pedras miliárias, que mostram o
caminho, mas não caminham”. Foi por vontade divina que os magos, quando
perderam de vista a estrela, levados pelo sentido humano, se dirigiram a
Jerusalém, buscando na cidade real o rei que nascera, para que o nascimento de
cristo fosse anunciado publicamente em primeiro lugar em Jerusalém, segundo o que
diz Isaías: “De Sião sairá a lei e de Jerusalém a palavra do senhor”. E também
“para que o cuidado dos magos, vindos de tão longe, condenasse a preguiça dos
judeus que estavam tão perto”.
4. Como Crisóstomo diz: “Se os magos tivessem
vindo procurar um rei terrestre teriam ficado decepcionados, porque teriam
enfrentado sem razão as dificuldades de um caminho tão longo”. E assim, nem o
teriam adorado, nem lhe teriam oferecido presentes. “Mas, porque procuravam o
rei do céu, mesmo não vendo nele nada da majestade real, o adoraram satisfeitos
unicamente com o testemunho da estrela”. Viram um homem e reconheceram a Deus.
E ofereceram presentes adequados à dignidade de Cristo: “Ouro, como a um grande
rei; incenso, utilizado nos sacrifícios divinos, como a Deus; e mirra, com a
qual são embalsamados os corpos dos mortos, indicando que iria morrer pela
salvação de todos”. Assim somos ensinados, diz Gregório: “A oferecer ao Rei
recém-nascido o ouro, que
representa a sabedoria, resplandecendo em sua presença com a luz da sabedoria”;
o incenso “com o qual expressamos a
dedicação da oração, e que oferecemos a Deus quando exalamos diante de Deus o
empenho das orações” e a mirra
“que representa a mortificação da carne” e que a oferecemos “quando
mortificamos os vícios da carne pela abstinência”.
(Suma Teológica, part. 3, quest.36, art. 8)
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