Parece que o advogado não peca defendendo causa
injusta, visto que:
1. Revela-se a perícia do médico ao curar um
doente em estado desesperador. Da mesma maneira se mostra a habilidade do
advogado se consegue defender uma causa injusta. O médico que realiza tal cura
é exaltado, logo, também o advogado, longe de pecar, merece antes louvor
defendendo uma causa injusta.
2. Além disso, é permitido renunciar a qualquer
pecado. Ora, é punido o advogado que trair a sua causa. Logo, não peca o
advogado defendendo uma causa injusta, uma vez que a tenha assumido.
3. Ademais, recorrer a meios injustos para
defender uma causa justa, por exemplo apresentando testemunhas falsas ou alegar
leis inexistentes, parece ser pecado mais grave do que defender uma causa
injusta, porque o primeiro pecado está na forma, o segundo na matéria. Ora,
consta que o advogado pode utilizar tais astúcias, assim como é lícito ao
soldado lutar armando emboscadas.
SOLUÇÃO: É ilícito cooperar com o mal, aconselhando, ajudando ou consentindo de qualquer modo,
pois, de certo modo, quem aconselha e coopera, de certo modo pratica. E o Apóstolo (São
Paulo) declara: “São dignos de morte não só os
que cometem o pecado, mas ainda quem aprova os que o cometem.” (Rm
1, 32) Ora, é evidente que o advogado dá ajuda e conselho àquele cuja causa
patrocina. Logo, se defende uma causa de cuja injustiça está ciente, peca, sem
dúvida, gravemente, e está obrigado a reparar o dano causado injustamente à
parte adversa por sua assistência ao cliente. Porém se defende uma causa
injusta na ignorância,
tendo-a por justa, estará escusado, na medida em que a ignorância pode escusar.
Quanto aos argumentos antes expostos deve-se
dizer, portanto, que:
1. Empreendendo o tratamento de um enfermo em
estado desesperador, o médico não
comete injustiça contra ninguém; o advogado, ao invés, aceitando
a defesa de uma causa injusta, lesa a
parte contra a qual vai pleitear. Logo, a comparação não é
válida, pois embora pareça merecer louvores pela perícia de sua arte, peca contra a justiça, abusando
de seu talento a serviço do mal.
2. Quanto ao segundo, deve-se dizer que o advogado
que, a princípio, julga a causa justa e descobre no decurso do processo que é
injusta, não deve traí-la, passando a ajudar a parte adversa ou lhe revelando
os segredos do seu cliente. Mas pode
e deve abandonar a causa, ou pode levar seu cliente a desistir
ou a entrar em composição, sem prejuízo para o adversário.
3. Quanto ao 3º, deve-se dizer que como já foi
explicado, ao soldado ou ao chefe do exército é lícito, numa guerra justa, usar
de astúcia, dissimulando prudentemente os seus planos. Não, porém, recorrer à
falsidade fraudulenta; pois “mesmo
para com o inimigo havemos de guardar a lealdade”, como lembra
Túlio. Portanto, ao advogado que
defende uma causa justa, é lícito ocultar prudentemente o que
poderia prejudicar o seu processo, mas não lhe é permitido, porém, usar de
falsidade.
(Suma Teológica, II-II, ques. 71, art.3)
Nenhum comentário:
Postar um comentário