IMITAÇÃO
DE CRISTO – TOMAS DE KEMPIS
LIVRO
QUARTO
CAPÍTULO
20
Da
confissão da própria fraqueza, e das misérias desta vida
1. A alma: Confesso contra mim mesmo minha
maldade (Sl 31,5), confesso, Senhor, minha fraqueza. Muitas vezes a menor coisa
basta para me abater e entristecer. Proponho agir valorosamente, mas assim que
me sobrevém uma pequena tentação, vejo-me em grandes apuros. Às vezes é de uma
coisa mesquinha que me vem grave aflição. E quando me julgo algum tanto seguro,
vejo-me, não raro, vencido por um sopro, quando menos o penso.
2. Olhai, pois, Senhor, para esta minha baixeza
e fragilidade, que conheceis perfeitamente. Compadecei-vos de mim e tirai-me da
lama, para que não fique atolado (Sl 68,18) e arruinado para sempre. É isto que
a miúdo me atormenta e confunde em vossa presença: o ser eu tão inclinado a
cair, e tão fraco a resistir às
paixões. E embora não me levem
ao pleno consentimento, muito me molestam e afligem seus assaltos, e muito me
enfastia o viver sempre nesta peleja. Nisto conheço minha fraqueza, que mais depressa
me vem do que se vão essas abomináveis fantasias da imaginação.
3. Ó poderosíssimo Deus de Israel, zelador das
almas fiéis, olhai para os trabalhos e dores de vosso servo, e assisti-lhe em
todos os seus empreendimentos! Confortai-me com a força celestial, para que não
me vença e domine o homem velho, a mísera carne, ainda não inteiramente sujeita
ao espírito, contra a qual será necessário
pelejar enquanto estiver nesta
miserável vida. Ai! que vida é esta, em que nunca faltam as tribulações e
misérias, em que tudo está cheio de inimigos e ciladas! Porque mal acaba um
tribulação ou tentação, outra já se aproxima, e até antes de acabar um combate,
muitos outros já sobrevêm, e inesperados.
4. E como se pode amar uma vida cheia de tantas
amarguras, sujeita a tantas calamidades e misérias? Como se pode chamar vida o que
gera tantas mortes e desgraças? E, não obstante, muitos amam e procuram nela
deleitar-se. Muitos acoimam o mundo de enganador e vão, e ainda assim lhes
custa deixá-lo, porque se
deixam dominar pelos apetites da
carne. Muitas coisas nos inclinam a amar o mundo, outras a desprezá-lo. Fazem
amar o mundo a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba
da vida; mas as penas e as misérias que estas coisas se seguem geram o ódio e
aborrecimento do mundo.
5. Infelizmente, o vil deleite vence a alma
mundana, que julga delícia o estar em meio dos espinhos (Jó 30,7), porque nunca
viu nem provou a doçura de Deus, nem a intrínseca suavidade da virtude. Mas
aqueles que perfeitamente desprezam o mundo e procuram viver para Deus, em
santa disciplina, experimentam a doçura divina, e mais claramente conhecem os
erros grosseiros do mundo
e seus vários enganos.
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